[Entrevista] Mara Gabrilli: a Lei de Cotas está ameaçada com a nova legislação trabalhista?
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Crédito da foto: Alexssandro Loyola |
A i.Social fez uma entrevista
exclusiva com a deputada federal Mara Gabrilli,
grande defensora dos direitos das pessoas com deficiência e autora de diversos
projetos de lei que têm como objetivo final melhorar a qualidade de vida das
PCDs. Mara comenta sobre seu trabalho na Câmara dos Deputados, o mercado
de trabalho para trabalhadores com deficiência, os desafios da inclusão e,
também, sobre as ameaças que a Lei de Cotas recebe diariamente.
Leia a
entrevista na íntegra abaixo!
i.Social: Você
tem muito contato com pessoas com deficiência, seja pessoalmente devido a sua
atuação como deputada e também através da interação com seus seguidores nas
redes sociais, correto? Quais são as principais dificuldades e desafios que
você enxerga para que elas tenham seu devido papel na sociedade, se qualifiquem
e sejam incluídas no mercado de trabalho?
Mara: Acredito
que o principal desafio é o acesso à educação. Infelizmente, ainda
existe uma dificuldade imensa em serem reconhecidos como alunos e terem todos
os apoios necessários para seu desenvolvimento. Se a pessoa não é reconhecida
nem como aluno, como será reconhecida como profissional? Hoje, o cenário é
muito melhor, sobretudo pelos direitos que a LBI garante e que passou a
considerar crime a cobrança a mais nas mensalidades motivada pela deficiência,
além da proibição de recusa de matricula.
Estamos trabalhando para uma nova
geração melhor preparada para o mercado de trabalho. Além
disso, existem outras dificuldades, sobretudo pela falta de acessibilidade nas cidades que impedem sua
participação na cultura, no lazer e em muitos outros âmbitos. Toda essa
vivência social também contribui muito para a formação da pessoa.
Por outro lado, considero que as pessoas com deficiência, por
enfrentarem e precisarem superar diariamente essas barreiras, se tornam grandes
guerreiras. Chegam com uma força de vontade, disciplina e
capacidade de superação que têm um valor imenso para
qualquer empresa, mesmo que não tenham conhecimento formal ou técnico. Elas
sabem enfrentar os ‘nãos’ e as dificuldades.
i.Social: Conversando
com as próprias pessoas com deficiência, vemos que existe uma divisão entre
aquelas que consideram a Lei de Cotas extremamente necessária para a inclusão e
outras que acreditam que a obrigatoriedade exigida pela Lei apenas reforça o
preconceito e leva ao simples preenchimento da cota. Como você enxerga essa
Lei?
Mara: Extremamente
necessária! Como qualquer outra ação afirmativa usada no Brasil ou no mundo, é
uma medida que vem para corrigir uma desigualdade histórica e promover um direito fundamental para uma
parcela da população que estava à margem da sociedade por conta da
discriminação. Toda ação afirmativa deve ser temporária, durar o tempo
necessário para se promover a igualdade de oportunidades e tratamento. Se não houvesse a Lei de Cotas, a discussão sobre as melhores
formas de inclusão profissional, sobre as possibilidades de crescimento e de
carreira, entre outras, não estariam tão em evidência. A
Lei fez as empresas passarem a prestar atenção na capacidade desse público em
maior proporção.
i.Social: Sobre a Lei de Cotas,
você considera que existam ameaças a ela? Há algum projeto de lei tentando
derrubar ou enfraquecer a Lei, por exemplo? Se sim, o que vem sendo feito para
combater essas ameaças? Há algum projeto para aperfeiçoar a Lei de Cotas?
Mara: Sou
autora de dois projetos de lei que aperfeiçoam a legislação: um que determina
que as empresas com 50 a 99 empregados tenham pelo menos um empregado com
deficiência em seus quadros de funcionários (PL 7239/2017), e outro que
institui o auxilio-inclusão, um beneficio de renda complementar ao trabalhador
com deficiência (PL 2130/2015).
O auxilio-inclusão já está previsto na LBI, vinculado somente à
pessoa que é beneficiária do BPC, mas o governo Dilma exigiu que houvesse uma
nova Lei posterior para sua aplicabilidade. No PL que criamos para dar a
aplicabilidade exigida, não restringimos somente aos beneficiários do BPC, mas
como um direito da pessoa baseado na gravidade da deficiência.
Infelizmente, há diversos grupos que trabalham contra a lei. Na Câmara dos Deputados
sempre aparece um grupo ligado a algum setor dizendo que não é possível cumprir
a lei, que no negócio deles é impossível, que não existem pessoas capacitadas,
e tantos outros mitos que ainda são repetidos. Gastam muito mais energia em
combater a lei do que buscando os melhores meios para cumpri-la. E
sabemos que existem diversas empresas que cumprem e fazem isso bem.
Toda semana tenho que sensibilizar alguém que vem me procurar
com esse discurso. Puxa, logo comigo?!
i.Social: A
inclusão de uma pessoa com deficiência depende muito da intervenção do poder
público. Na época da LBI, por exemplo, você tentou aprovar a cota de, pelo
menos, uma PCD em empresas com 50 a 99 funcionários, mas a proposta foi vetada.
É mais difícil emplacar um projeto de lei neste segmento? Se sim, por quê?
Aliás, sobre a cota para empresas com menos de 99 funcionários, a proposta foi
totalmente descartada ou você pretende relançá-la futuramente?
Mara: Como
contei, reapresentamos a proposta como um novo projeto de lei (PL 7239/2017).
Ficamos bastante frustrados com o veto porque negociamos ponto por ponto da LBI
com o governo, fizemos concessões retirando pontos em que o governo era
contrário como, por exemplo, a ampliação dos critérios para concessão do BPC,
que passaria de ¼ para ½ salário mínimo per capita. Havia o compromisso do
governo em aprovar a LBI sem vetos. Infelizmente não cumpriram o prometido e a
presidente Dilma vetou sete artigos da LBI, entre eles a obrigação de
contratação de ao menos um funcionário com deficiência por empresas que têm de
50 a 99 empregados, alegando que a medida poderia gerar impacto relevante no
setor produtivo e dificuldades no seu cumprimento. Puxa, foi um ato péssimo
porque ela negou a capacidade de trabalho e de produtividade das pessoas com
deficiência.
i.Social: Falando sobre projetos de
lei, desde a aprovação da Reforma Trabalhista, muitas pessoas com deficiência
ficaram receosas em ter ainda mais dificuldades para encontrar uma vaga no
mercado de trabalho. Esse é o tipo de dúvida que nós da i.Social quase sempre
recebemos. Em julho deste ano, você e os deputados Eduardo Barbosa e Otavio
Leite conseguiram retirar qualquer modificação que a Reforma traria para a Lei
de Cotas, mas, ainda assim, essa é uma dúvida recorrente. Você poderia, então,
comentar sobre suas expectativas quanto à garantia dos direitos das PCDs, seja
no que diz respeito ao mercado de trabalho, quanto à vida social/profissional
da pessoa com deficiência como um todo?
Mara: A
proposta da reforma trabalhista apresentada pelo relator trazia muitos
prejuízos tanto para a lei de cotas, quanto para a contratação do menor
aprendiz. Conseguimos negociar com o relator, que acabou
retirando os artigos que faziam essas mudanças na legislação. No âmbito
legislativo, como já falamos anteriormente, existem as ameaças diárias à lei de cotas, que trabalhamos no
dia a dia para derrubá-las. E tenho também uma preocupação em relação à
terceirização, que pode trazer alguns entraves à lei de cotas.
A lei da terceirização,
aprovada no Congresso, representa uma grande ameaça à Lei de Cotas.
Terceirizando sua atividade fim, empresas poderão reduzir seu quadro de
funcionários, desobrigando-se do cumprimento da Lei de Cotas e deixando de
contratar muitos funcionários com deficiência.
Não podemos esquecer que temos uma população com deficiência que
ainda luta muito por oportunidades iguais no mercado de trabalho e a Lei de Cotas
tem sido fundamental para a concretização deste direito. Queríamos que o
cumprimento da cota pela empresa contratante fosse feito considerando-se a
somatória de funcionários contratados e funcionários terceirizados. No entanto,
infelizmente, o texto foi aprovado sem essa modificação.
No entanto, fora do legislativo existe outro grande entrave para
a empregabilidade da pessoa com deficiência, que são as barreiras atitudinais. Ainda existe muito
preconceito por gestores de empresas. Esse cenário está começando a mudar, mas
é preciso reforçar o trabalho junto aos gestores e recursos humanos das
empresas para aumentar a conscientização da importância da contratação destes
profissionais. Só assim conseguiremos avançar.
Crédito da foto: Alexssandro Loyola
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com deficiência no mercado de trabalho. Acesse nosso site ou entre contato
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Fonte: iSocial
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