Pai de três filhos com autismo conta como aprendeu a encarar a vida de forma otimista
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Pai de três filhos com autismo conta como aprendeu a encarar a vida de forma otimista |
“Você tem duas opções: ficar chorando na cama,
lamentando uma coisa que não vai mudar ou você ir atrás de informação, de ajuda
e profissionais que estejam comprometidos e informados. Eu escolhi a segunda
opção”
Receber um diagnóstico de autismo para um
filho não é fácil para nenhuma família. Além de ter nuances desconhecidas
pela ciência, o transtorno exige dedicação intensa dos pais e um investimento
extra para que a criança receba os tratamentos adequados. Imagine, então,
receber essa notícia três vezes. Foi o que aconteceu com Pedro*, hoje com 34
anos. Seus três filhos, de dois casamentos, têm autismo. Conversamos com ele
para saber o que sentiu após receber os diagnósticos e como é a rotina com as
crianças. A certeza de que há perspectivas otimistas para os meninos faz com
que Pedro continue buscando ajuda e dá uma injeção de ânimo em quem vive
situação parecida.
CRESCER: Como foi receber o diagnóstico pela
primeira vez e como você lidou com os outros dois?
PEDRO: Eu tinha 22 anos,
não era casado, mas tinha uma relação com uma mulher bem mais velha. Nós
tivemos dois filhos. Ela era independente e nós não vivíamos juntos. Foi ela
quem me procurou e contou que os dois meninos eram especiais [hoje eles têm 8 e 10 anos e moram com a mãe]. Mas na época
ela contou que tinha um caso de problema neurológico na família e eu
assumi que o problema seria da parte dela. Seguimos com nossas vidas, dando a
atenção necessária aos meninos. Porém, há quatro anos eu me casei e logo em
seguida tive meu terceiro filho. E há um ano e meio veio o diagnóstico: ele
também era autista. Aí realmente o mundo desabou na minha cabeça porque eu
percebi que a carga genética era minha.
C: E o que você fez?
P.: Quando veio o diagnóstico do terceiro
comecei a fazer contato com minha ex-companheira, busquei informações e
descobri o dr. Alysson [Muotri, pesquisador brasileiro
que trabalha na Universidade da Califórnia, estudando o autismo].
Também entrei em contato com a dra. Maria Rita Passos Bueno [que desenvolve
pesquisa em autismo no Centro do Estudos do Genoma Humano]. Em um primeiro
momento, a sensação foi muito ruim. Como homem você se sente muito mal,
porque é como se você tivesse feito mal às crianças. Fui buscar ajuda
terapêutica e tive acompanhamento psiquiátrico. Faço terapia até hoje para
poder enfrentar isso tudo. Mas, passado o primeiro momento, você percebe que ou
fica na cama chorando ou enfrenta, e eu escolhi a segunda opção.
C: Como é o tratamento deles?
P.: Os três fazem acompanhamento com
terapeuta ocupacional, psicomotricistas e frequentam a escola regular. O mais
velho, que no primeiro momento tinha todos os traços de autismo clássico, hoje
já evoluiu para Asperger [que também faz parte do
transtorno de espectro autista] e o psiquiatra nos falou que “ele
já foi”. Isto é, provavelmente vai levar uma vida independente, vai casar, ter
uma profissão, tamanha a evolução dele. E isso enche muito a gente de
esperança.
C: Você acredita que essa evolução tem a ver com os
estímulos que vocês proporcionaram?
P.: Sem sombra de dúvidas, o ideal é
intervir o mais cedo possível. A intervenção do mais velho não foi tão cedo
quanto o mais novo. E mesmo assim ele apresenta melhoras significativas, já não
tem estereotipia nenhuma. É inteligentíssimo, nunca repetiu de ano e não aceita
tirar menos de 8,5 nas provas. O mais novo, de 3 anos, já está começando a
falar, com certeza porque nós começamos com as terapias cedo. Ele tinha 2 anos
quando foi diagnosticado. Já o segundo, com 8 anos, é o mais limitado, ele tem
um quadro de autismo clássico realmente, ainda não fala.
C: Com três filhos de idades diferentes, você nota
alguma evolução no tratamento do autismo?
P.: O mais novo teve acesso a algumas
vitaminas importadas. Na época dos mais velhos não demos. Mas, na verdade,
muita coisa do tratamento do mais novo foi feita nos Estados Unidos, porque
muitos médicos brasileiros desconhecem. As vitaminas, por exemplo, foram
recomendadas por uma pediatra norte-americana. É difícil porque os médicos nem
sempre estão preparados para tratar essas crianças. Essa pediatra mesmo me
disse que o que ela estudou sobre autismo na faculdade não tem nada a ver com o
que está no consultório. E nós fizemos lá alguns exames que não são pedidos
aqui e por sorte hoje eu tenho condições financeiras para isso. Eu não tenho
dúvida de que o autismo está relacionado também a questões metabólicas. Nos
exames, várias taxas estavam desreguladas. Nós fizemos com o mais novo a dieta
celíaca, cortamos a lactose e eu tenho uma visão de que isso funciona. E meu
filho hoje com 3 anos está falando.
C: Você tem contato com outros pais de crianças
autistas?
P.: Eu não tenho, mas acho que em alguns
casos é importante. Acho que aqueles que têm menos condições financeiras
precisam de uma força extra, porque o tratamento é difícil e nem um pouco
barato. Para uma criança fazer todos esses tratamentos não sai por menos de 6
mil reais por mês.
C: Como seus filhos se relacionam entre si?
P.: Os dois mais velhos não têm contato com
o mais novo. Mas o mais velho entende que o irmão tem uma dificuldade e ajuda a
cuidar, tem um carinho todo especial. Mas ele não aceita que tem o mesmo
problema, porque ele vê o irmão e não aceita que haja tamanha diferença na
evolução dos dois.
C.: Que dica você daria para um pai que está
enfrentando essa situação?
P.: Eu sou kardecista, é uma crença
particular, mas acho que nada na vida acontece por acaso. E aí não tem jeito,
você vai passar pelas fases que são naturais. Primeiro, aquela tijolada que
você recebe na cabeça. Depois, e aí é que está a grande dica, você tem duas
opções: ficar chorando na cama, lamentando uma coisa que não vai mudar ou você
ir atrás de informação, de ajuda e profissionais que estejam comprometidos e
informados. Grandes médicos hoje não acreditam em nada do que a gente está
falando, acreditam que o diagnóstico de autismo é uma sentença e acabou. E não
é verdade. Claro que existem casos e casos, e os quadros mais graves do
espectro nem sempre evoluem bem. Mas você não pode definir o diagnóstico como
uma sentença. Tenha fé e não pense que, se o seu filho não evoluiu como você
esperava, foi uma viagem perdida. Os resultados podem aparecer em prazos
longos, por isso que paciência e fé são fundamentais. Tenha certeza, como pai
de crianças especiais, que paciência e fé não são coisas grandes de se pedir.
Eu falo de coração aberto: este ano passei o Dia dos Pais ouvindo meu filho me
chamar de papai. No ano passado, saí do consultório médico sentenciado que não
aconteceria. Então, já valeu a pena.
*O nome do pai foi trocado a pedido do entrevistado
Fonte: Marcela Bourroul,
Revista Crescer - http://www.deficienteciente.com.br/
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