‘São minha razão de viver’, diz mãe de gêmeos com síndrome raríssima
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Descrição da imagem: dois irmãos autistas com sua mãe no sofá. |
“A mãe cria o filho para casar, ter
uma família. Mas a mãe que tem filhos especiais cria para elas. Eles vão ser
bebês para o resto da vida”. As frases são de Creuza Rosa de Souza, que é
moradora de Mogi das Cruzes (SP) e mãe dos gêmeos Fábio e Fabrício. Portadores
de uma forma severa de autismo, os “bebês” de Creuza estão com 25 anos e têm
quase a mesma altura dela. Eles não falam e dependem da mãe para comer e ir ao
banheiro. Às vezes, têm crise de agressividade. “Eu estava pensando em comprar
uma camisa de força”, diz com a mesma sinceridade com que reflete: “eu acho que
eu sem eles é como um barco sem rio e um passarinho sem água. Eles são minha
razão de viver.”
Creuza conta como é a rotina dos
gêmeos. “Eles costumam acordar por volta das 10h. Eu levo para o banheiro, dou
banho, troco a roupa. Dou o café e por volta do meio-dia dou almoço para eles.
A comida tem que ser bem cortadinha. Sou a mão e o braço deles. Eles dependem
de mim totalmente.”
Apesar de problemas na coordenação
motora, Fábio e Fabrício não têm restrições físicas. O que eles mais fazem é
observar o movimento da rua onde moram, no bairro Mogi Moderno. “Apelidaram
eles de ‘os meninos da esquina’. Fica um num lado da esquina e o outro do
outro. E eu tenho que ficar junto, de olho”, continua a mãe, que teve que
ensinar aos dois o básico para se comunicar. “Eles não falam. Eu sei quando
eles estão com dor por causa da cara. Quando quer tomar café é com um gesto,
comer, outro gesto. São gestos que eu ensinei”.
Síndrome rara
Os meninos foram diagnosticados com
quatro anos de idade. “Eles nasceram sem o céu da boca. Com o passar do tempo
não conseguiam andar. Levamos eles para a USP de Bauru para fazer a cirurgia no
céu da boca. Lá, um geneticista descobriu que eles têm uma sindrome rara no
Brasil, que engloba o autismo”, conta a mãe.
Ambos são possui a síndrome de
Smith-Fineman-Myers. “Tem oito casos no mundo inteiro e aqui no Brasil eles são
únicos por serem gêmeos”, explica Creuza. Em 1998 Fábio e Fabrício foram
assunto de uma revista americana de medicina. Na infância, eles também passaram
por cirurgias nos ouvidos, garganta e nariz.
A mãe conta que não consegue mais
levá-los para fazer tratamento. “Não consigo levar mais para Bauru. Quando eles
eram pequenos eu arrastava para cá e para lá, mas agora eles são homens e
quando não querem fazer alguma coisa eles sentam no chão e dificulta tudo. Eu
desisti de Bauru. Não sei se eles tinham mais alguma coisa para fazer lá, mas
eu não tinha mais condições de ir.”
Dedicação
Quando os gêmeos nasceram, Creuza já
era mãe de um casal. Hoje o filho mais velho tem 36 anos e a segunda filha tem
32. “O Fábio e o Fabrício me deram muito trabalho quando eram crianças. Se
engasgavam, perdiam a respiração, quebravam o vidro da porta da casa,
machucavam a mão… É complicado, é ate hoje. Mas a gente vai fazer o quê? Eles
não pediram para vir ao mundo, a gente tem que ter paciência.”
Os gêmeos estão sempre juntos para fazer
tudo. “O Fábio é mais carinhoso, gosta que beije ele e abrace. Já o Fabrício é
mais arredio, se vai fazer isso ele fica nervoso, não quer. Eles se dão bem um
com o outro, mas às vezes é um pega para capar. Eles gostam de assistir Chaves,
Shrek e futebol. Acho que o Fabrício é corintiano, quando passa jogo do
Corinthians ele beija a camisa. Uma vez um homem que estava de fogo passou na
rua, falou ‘olha o Timão’ e beijou a camisa, então ele beija também”, conta a
mãe.
Atualmente com 52 anos, Creuza recorda
que trabalhava como cabeleireira, ofício que abandonou quando os gêmeos
nasceram. A família vive com a aposentadoria do marido, que está com 50 anos e
atualmente faz bicos como servente de pedreiro.
Quando o pai dos meninos volta do
serviço, por volta das 19h, a família passeia de carro com os meninos na
Avenida Cívica. “É a única diversão deles. A gente volta para casa, coloca eles
para dormir e termina o dia”, conta Creuza.
Crises de agressividade
Creuza não tem com quem deixar os
meninos para fazer as atividades do dia a dia. “Para ir no mercado tem que ir
com eles. Uma vez o Fábio brigou com o pai e quase quebrou as coisas do
mercado. O segurança que fez amizade com eles conversou e conseguiu acalmar.”
A personalidade dos gêmeos é
imprevísível. “Quando eles gostam de uma pessoa, é um amor verdadeiro. Grudam
com a pessoa, mas se não gosta é bom não ficar perto senão eles são capazes de
voar em cima”, diz a mãe.
Apesar de calmos a maior parte do
tempo, há ocasiões em que eles são agressivos. “Estou fazendo comida, de
repente eles vêm por trás e me atacam, dão um tapa na minha cara. Isso é do
nada”, conta Creuza.
Ela está preocupada com as crises.
“Dia desses, o Fábio começou a atacar o meu marido dirigindo. Dava tapas nele,
agarrava ele. Eu tive que pular do banco da frente para trás e o meu marido
dirigindo teve que arranjar um acostamento para parar o carro. Eu estava
pensando em comprar uma camisa de força. O Fábio é direto que ele tem crise
ultimamente. Ele gosta de passear mas é agressivo com o pai”, relata.
Tentativas de tratamento
Creuza conta que já tentou buscar
tratamento para os meninos. “A Apae ficou com eles dos 8 até os 20 anos. Mas
chegou uma hora que já não valia mais a pena. Quando ficaram grandes, eles só
faziam meia hora de atividades. Disseram que eles tinham que sair da fralda.
Depois de um tempo, era difícil fazer meus filhos acordarem cedo para ir para
lá, ficar pouco tempo e voltar embora.”
Para a mãe, falta em Mogi das Cruzes
um lugar especializado para acolher pessoas com autismo já na idade adulta.
“Teria que ter uma casa assistida para deixar o filhos e a mãe ir se tratar. Se
a mãe está ruim como que vai cuidar dos filhos direito? Os meus ainda são
sociáveis, vão no mercado, mas tem mães que os filhos não põem a cara para
fora, os filhos ficam trancados dentro de casa”, diz.
A família recebeu uma ligação da
Prefeitura de Mogi convidando os gêmeos para passar por uma avaliação no Centro
de Atenção Psicossocial (Caps). Creuza levou os filhos na última terça-feira
(22) e conversou com uma psicóloga, mas ainda está desconfiada. “Lá é feito
tratamento de pessoas que têm problemas com drogas, alcoolismo e quem tem
problemas mentais como esquizofrenia. Não é um ambiente para as crianças. Mas
vamos ver, se pelo menos ficarem com eles na parte da manhã dá para eu fazer
minhas coisas”, comenta. O próximo passo é submeter os gêmeos à avaliação de um
psiquiatra.
Missão
Creuza fica preocupada quando pensa no
futuro. “Eu penso no dia que eu não estiver aqui, como eles vão ficar ou quando
eu envelhecer mais, como vou cuidar deles. Eu tenho 52 e já me sinto
desgastada, fraca… Eu peço a Deus que me dê força para cuidar deles”, diz.
Porém, ela está longe de ver sua
dedicação como um fardo. “Eles não são uma cruz, é uma missão. Quando Deus te
dá uma missão, não tem como passar a bola para outras pessoas. Eu acho que tudo
que eu passo com eles é porque Deus está me testando de alguma forma. Tem
pessoas com problemas muito piores do que o meu.”
Fonte: site G1.com Mogi das Cruzes e
Suzano por Pedro Carlos Leite.
Fonte: Blog Sempre Incluídos
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