Fãs com deficiencia sofrem com falta de informações sobre show de Paul McCartney
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Não há dúvidas de que os milhares
de fãs que compraram ingressos para o show de Paul McCartney no Mineirão,
neste sábado, estão ansiosos para ver o ídolo no palco. Mas existe uma parcela
do público que, além de lidar com a ansiedade natural de qualquer grande
espetáculo, ainda precisa se preocupar com problemas práticos, como o fato de
não ter certeza de que o estádio está preparado para recebê-lo.
O problema de acessibilidade em estádios, também
observado no Independência, em Belo Horizonte, já está na pauta do
Ministério Público de Minas Gerais. De acordo com a assessoria do órgão, o
promotor Rodrigo Filgueiras deve entrar com uma ação que proíbe a realização de
qualquer evento no Mineirão enquanto os problemas não estejam resolvidos. O
promotor ainda evita revelar detalhes da ação, porque deve dar entrevista
coletiva sobre o assunto na próxima semana. Saiba mais aqui.
Enquanto isso, quem vai ao show do Paul McCartney
neste sábado ainda tem dúvidas em relação a acessibilidade. É o caso de Rachel
Ribeiro, que entrou em contato com o Divirta-se relatando receio em relação à
apresentação. O marido dela, que também vai ao espetáculo, tem mobilidade
reduzida por problemas de saúde, e ela não conseguiu informações sobre locais
reservados para portadores de necessidades especiais (PNE), nem de acesso preferencial
na entrada do show.
Assim como Rachel, várias pessoas encaminharam
reclamações sobre o mesmo assunto tanto à administradora do Mineirão, a Minas
Arena, quanto à produtora do show, a Nó de Rosa.
Respostas
A Nó de Rosa, produtora que traz
Paul a BH, esclarece que portadores de necessidades especiais entrarão no
estádio por um único portão, de onde serão encaminhados aos demais setores. De
acordo com a assessora de imprensa Luciana Mayer, funcionários da organização
estarão à disposição para orientar e guiar estas pessoas até os espaços
reservados. A assessoria explica ainda que setores com cadeiras já possuem
áreas exclusivas para cadeiras de rodas. As pistas comum e premium, onde
espectadores ficam de pé, contarão com espaços na parte da frente dos setores
dedicados à parcela do público com mobilidade reduzida. O ponto indicado para a
entrada dos portadores de necessidades especiais é o Portão E, no setor
vermelho, que fica na Avenida C.
Site da PlanMusic: "não haverá acesso para cadeirantes para os demais setores" (clique para ampliar imagem) |
Entretanto, o site oficial da turnê de
Paul McCartney no Brasil, gerido pela produtora PlanMusic, aponta informações
divergentes ao divulgado pela parte belo-horizontina da organização. Na página,
que reúne dados sobre as três apresentações do Beatle no país, os setores do
Mineirão indicados como reservados para pessoas com deficiência são apenas
três. Na seção de dúvidas, há um tópico dedicado ao assunto: "Há um lugar reservado
para cadeirantes/Portadores de Necessidades Especiais (PNE)?". A resposta
aparece no site como segue: "Sim, haverá um local específico para
cadeirantes e PNE", com a indicação dos setores "Belo Horizonte:
Cadeira inferior roxa - Portões A e B; Cadeira inferior amarela - Portão C;
Cadeira inferior vermelha - Portões D e E". A mesma explicação ainda
determina que "Não haverá acesso para cadeirantes para os demais
setores".
De acordo com a assessoria da Minas Arena, empresa
que administra o Mineirão, o estádio está preparado para receber pessoas com
deficiência, idosos e grávidas. Todas as normas exigidas por lei teriam sido
implantadas durante a recente reforma do Mineirão, fato que vem sendo
questionado pelo Ministério Público de Minas Gerais e pelo Ministério
Público Federal. Porém, a garantia de acessibilidade e locais reservados seriam
de inteira responsabilidade da organizadora do show.
Ainda segundo a administradora, a única área do
estádio que não possui rampas de acesso e áreas especiais para cadeirantes é o
anel superior, parte arquitetônica que é tombada pelo patrimônio histórico e
não pode ser modificada. Em todo o resto das instalações, a arena possui
"vários aparelhos visando o bem das pessoas com mobilidade reduzida",
explica a assessora Sandra Barroca. Entre as características que garantem
acessibilidade, ela cita "piso sinalizador de direção dentro do estádio e
de piso podotátil em todo o entorno, rampas de acessibilidade internas,
instalação de cadeiras para obesos, cabines preferenciais para venda de
ingressos, oito elevadores destinados às pessoas portadoras de deficiência,
dentre outros".
Nos estacionamentos do Mineirão há 53 vagas
exclusivas para veículos que conduzam ou que sejam conduzidos por pessoas com
deficiência, o que representa 2% do total. "Elas estão distribuídas nos
dois níveis de estacionamento coberto e localizadas próximas aos acessos à
esplanada equipados com elevador", ressalta Sandra.
Obstáculos
Rachel adquiriu ingressos para a cadeira inferior
roxa, que tem local reservado para PNE, mas sentiu falta de informações claras
enquanto efetuava a compra. “Não vimos nenhum informativo ou cláusula a esse
respeito no ato da compra para o show do Paul. Aliás, termos conseguido o
ticket, com todas as fragilidades e deficiências apresentadas pelo site www.ingresso.com, já
foi uma vitória. Adquirimos cadeiras inferiores roxas porque foram nelas que
ficamos no show do Elton John, e gostamos de sua localização em relação ao
palco”, relata. De acordo com Luciana Mayer, assessora da Nó de Rosa, os
ingressos de PNE trazem impressas as informações sobre a entrada especial pelo
Portão E.
Insatisfação
Mesmo se os pagantes tivessem sido informados sobre
o local específico para PNE de maneira mais clara, a produtora ainda estaria
infringindo a lei. É o que afirma o vereador de Belo Horizonte Leonardo Mattos,
do PV. Cadeirante e conhecido pela luta pelos direitos de pessoas com
deficiência, o político explica que, apesar de não haver uma lei específica
para shows, a produtora deve seguir as normas garantidas pelo Decreto-Lei
5296/2004, que abrange qualquer tipo de evento no país. Nos casos em que são
disponibilizados ingressos em apenas um setor, a pessoa com deficiência é
obrigada a pagar um valor determinado, enquanto outros pagantes puderam
escolher, tanto em relação à condição financeira, quanto em relação ao local
mais confortável para apreciar o show. “A produtora não pode definir quanto a
pessoa vai pagar. Isso atinge a dignidade do cliente. Nas pistas, por exemplo,
um cadeirante não enxergaria nada. Mas como ele pagou o ingresso, devem ser
garantidos os direitos dele”, explica Leonardo.
O próprio vereador já passou por situação parecida,
em um jogo no Estádio Independência. Segundo o parlamentar, o local tem falhas
graves em relação à acessibilidade e, por se sentir lesado, Leonardo recorreu
ao Procon e recebeu seu dinheiro de volta. “É claro que isso não compensa o
fato de uma pessoa não conseguir ver um jogo, ou assistir a um show. Mas é
importante que elas procurem seus direitos e não recuem. Qualquer um que se
sentir atingido, e fizer algo a respeito, está ajudando também outras pessoas
que passam pelo mesmo problema”, garante.
O QUE DIZ A LEI
Alessandra Drummond |
A advogada Alessandra Drummond,
especialista em direito e entretenimento, esclarece que há leis nos âmbitos
federal, estadual e municipal que garantem direitos aos PNE no caso do show do
Paul McCartney em BH, além da constituição em si. A Lei Federal 10.098/2000,
por exemplo, define que pessoas com deficiência ou com mobilidade reduzida
devem ter espaços reservados em eventos como esse. “O Decreto 5.296/04, que
regulamenta a referida lei, define que tais locais reservarão pelo menos 2% da
lotação para pessoas em cadeira de rodas, distribuídos pelo recinto em locais
diversos, de boa visibilidade, próximos aos corredores, devidamente
sinalizados, evitando-se áreas segregadas de público e a obstrução das saídas”,
afirma Alessandra.
Ainda segundo a advogada, no âmbito estadual, a Lei
nº 11.666/94 exige local destinado a cadeira de rodas em auditórios,
anfiteatros e salas de reunião ou de espetáculos. Já o município exige, por
meio da Lei 7.556/98, instalações especiais para pessoas com deficiência física
em estabelecimentos de lazer, e determina que “a casa de espetáculo, o cinema,
o teatro e estabelecimento similar reservarão 2% de sua capacidade de lotação
para a pessoa com deficiência física, em espaço com piso rebaixado para encaixe
de cadeira de rodas, distribuído em vários pontos”.
Alessandra ainda lembra que a Associação Brasileira
de Normas Técnicas (ABTN) possui um manual de acessibilidade que dispõe das
regulamentações necessárias para o conforto e segurança de pessoas com
deficiência. “É só dar uma lida rápida nesse manual que se percebe que
dificilmente ele está sendo cumprido. Infelizmente estamos a anos luz de
garantir essas normas”, diz a advogada.
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