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Autoras do livro 'Um olhar diferente
sobre a moda', que tem versão em braile, falam ao blogVencerLimites sobre a
situação atual da moda inclusiva no País e o interesse das grandes marcas internacionais.
Especialistas listam as estratégias para ganhar destaque no setor que ainda
enfrenta barreiras, preconceito ou desinformação sobre seu potencial de vendas.
Estilistas citam os desafios para evoluir e a importância do Prêmio Brasil Sul
de Moda Inclusiva, que está com inscrições abertas.
“A moda fala de
atualidade, economia, história, antropologia e do tempo”, afirma o estilista
Ronaldo Fraga no prefácio do livro ‘Um olhar diferente sobre a moda’,
lançamento do Instituto Social Nação Brasil, que tem versão em braile
produzida com apoio da Fundação Dorina Nowill para Cegos.
O trabalho reúne textos
de mestres, professores e estilistas de diversas instituições de ensino do
País, e integra as iniciativas da sexta edição do Prêmio Brasil
Sul de Moda Inclusiva, que está com inscrições abertas (www.facebook.com/scmodainclusiva).
Em entrevista ao
blogVencerLimites, quatro autoras do livro (Patrícia Sant’Anna, Vitoria
Cuervo, Dariene Rodrigues e Silvana Louro) falam sobre a situação atual da
moda inclusiva no País e o interesse das grandes marcas internacionais, listam
as estratégias para ganhar destaque no setor que ainda enfrenta barreiras,
preconceito ou desinformação sobre seu potencial de vendas, além dos desafios
para evoluir.
blogVencerLimites – Qual
a situação atual da moda inclusiva?
Patrícia Sant’Anna
– Com o crescimento da classe média e da inclusão das pessoas com
deficiência, o mercado de moda inclusiva tende a crescer mais e mais.
Vitoria Cuervo – No
Brasil já existem algumas pequenas marcas de estilistas que estão adaptando
algumas peças em suas coleções. Algumas têm lojas virtual e outras ainda estão
só no boca a boca, em alguns pontos de sua terra natal ou apenas fazendo
coleções e desfiles com peças experimentais.
Vemos também alguns
alunos da área de moda/design fazendo seus trabalhos de faculdades sobre
inclusão, mas nem todos trabalham com isso após a graduação.
Temos alguns concursos e
isso incentiva alunos e profissionais da área a olhar para esse universo e
propor novas soluções, o que vai movimentando o interesse para esse mercado.
Mas o consumidor de fato ainda está se acostumando com a ideia de ter um
vestuário pensando nas suas necessidades, isso não existia e por toda vida ele
deu seu jeito pra se vestir adequadamente.
É tudo uma novidade
ainda, mas tem esse movimento, embora a pequenos passos. Lá fora já tem algumas
marcas e bastante coisa virtual, mas as grandes marcas conceituadas já viram a
real necessidade e estão lançando coleções inclusivas, como as americanas Tommy
Hilfinger e a Target. E isso é bom pra nós, porque o brasileiro só dá valor
muitas vezes pras coisas quando lá fora estão fazendo.
Dariene Rodrigues
– A moda inclusiva faz parte de uma nova temática da moda, com papel
cultural absolutamente inovador e que reflete as mudanças da sociedade. É
mostrar a importância da inclusão e que todos precisam participar com as suas
diferenças, respeitando a diversidade humana.
Silvana Louro
– Alguns anos atrás, as pessoas ficavam admiradas, nunca tinham ouvido
falar, mas hoje isso raramente acontece. O universo da moda inclusiva já é
conhecido.
blogVencerLimites – A
moda inclusiva já desperta interesse de grandes empresas do setor?
Patrícia Sant’Anna
– No Brasil não conheço iniciativa, mas fora do país já começa a ter
algumas marcas que se aproximam do tema e do desafio de fazer roupas inclusivas
ou que sejam de fácil adaptação, caso seja necessário.
Vitoria Cuervo
– Acho que desperta curiosidade apenas. Acho que não se deram conta ainda
da real necessidade, até porque nenhuma grande empresa já está fazendo, mas
acredito que quando a primeira der o primeiro passo e, claro, for sucesso, daí
todas irão querer fazer. Porque quando se fala em dinheiro, daí vira
superinteressante, mas se falamos apenas em necessidade, daí não é ‘problema
deles’.
Eu sei que isso pode
parecer meio pesado, mas eu não consigo entender porque até hoje não teve um
interesse concreto das grandes marcas e até dos estilistas conceituados. E não
falo só de representatividade, de convidar pessoas com deficiência para
desfilar. Isso é legal também, mas falo de pensar em um vestuário para todo
mundo, pensado nas pessoas com deficiência. Mesmo que não vá vender milhões,
mas as pessoas saberem que lá naquela loja tem uma roupa que vai ficar bem nela
e que ela possa comprar e levar pra casa.
Eu, como estilista
pequena e de moda autoral, não vou desistir disso e eu estou indo atrás das
empresas. Quero mostrar que é sim uma roupa necessária, que tem gente sim que
gostaria de usar isso e estou aberta para fazer parcerias com meu olhar e meu
conhecimento na área.
Dariene Rodrigues
– Infelizmente não. As empresas ainda não perceberam o grande potencial de
mercado. Muitas pessoas necessitam ser incluídas no acesso a produtos e
serviços. Enfim, uma oportunidade real das grandes e médias empresas
conseguirem atrair novos clientes.
Silvana
Louro – Tudo é uma questão de oportunidade e posicionamento. Eu acredito
muito no meu trabalho, sei da importância dele e isso faz com que as empresas
me ouçam. Firmei minha primeira parceria com uma grande marca com lançamento da
coleção previsto para ano que vem. Ainda é pouco, estamos no inicio, mas também
é uma vitória.
blogVencerLimites
– É possível, no cenário atual, ser profissional da moda inclusiva e viver
desse trabalho?
Patrícia
Sant’Anna – Sim, como qualquer nicho, o pulo do gato é ganhar confiança
entre os clientes, e estar aberto a criar sempre, tendo em foco as demandas
desse nicho. É necessário se dedicar, conhecer, sempre se atualizar e estar
atento às novas tecnologias que podem facilitar as soluções para seus clientes.
Como qualquer empreendimento, é necessário persistência, foco, planejamento e
conhecer o campo em que vai atuar.
Vitoria Cuervo
– Claro que sim, até porque quando eu falo numa roupa inclusiva, eu falo
em roupa para todos. Eu não tenho a intenção de fazer só roupa para pessoas com
alguma deficiência. Eu quero que todo mundo, pessoas com e sem deficiência,
tenham acesso à minha roupa, de madeira igualitária.
A pessoa com nanismo,
por exemplo, vai usar uma peça com o mesmo estilo da roupa que é para quem não
tem deficiência, mas com algumas adaptações. E a peça pensada para cadeirante
também pode ser usada por quem não tem deficiência. Uma coisa não excluia
outra.
No momento eu vendo, de
fato, mais para as pessoas sem deficiência, inclusive as peças adaptadas,
porque elas são bonitas e modernas.
Dariene Rodrigues
– A moda inclusiva pode ser mais uma opção para as pessoas que já
trabalham com moda.
Silvana Louro – Sou
do grupo ‘Sebrae de Moda Sustentável’ e considerei pertinente a orientação de
atender pessoas com e sem deficiência simultaneamente. Seria excludente
produzir moda apenas para pessoas com deficiências. Gosto da ideia de criar a
oportunidade da experiência de compra conjunta entre pessoas com e sem
deficiência. Isso é inclusão e, ao mesmo tempo, amplia minha área de atuação.
blogVencerLimites – Há
barreiras, preconceito ou desinformação sobre o potencial de vendas?
Patrícia Sant’Anna
– A barreiral principal é saber quais tipos de deficiência você vai
atender, se você tem conhecimento aprofundado sobre ela, quais as soluções que
já existem no mercado, se o caminho é pela adaptação de roupas prontas ou se é
de confecção específica, se você sabe como penetrar nesse mercado.
Mas quem quer usar moda?
Jovens? Mulheres? Crianças? Enfim, assim como qualquer marca de moda, temos que
definir as segmentações que vamos atender.
Vitoria Cuervo – Na
verdade, ainda existe muita falta de informação, por falta de oportunidades,
porque as pessoas não convivem com as diferenças ou porque não é muito falado,
apenas nos meios mais específicos. Muita gente nem sonha que existe isso ou,
quando ficam sabendo, ficam surpresos por nunca ter pensado a respeito, que não
tinham ideia de vestuário diferente do que existe no mercado.
As próprias pessoas com
deficiência, até pouco tempo, se viravam com o que tinha no mercado e deram seu
jeito. Então, até para elas é uma novidade esse vestuário adaptado e pronto pra
elas comprarem sem precisar fazer ajustes.
Não se tem a cultura de
ir comprar uma peça adaptada e isso não vai mudar de um dia para outro. Ainda
mais que não se encontra com facilidade essas roupas.
Tem sim um grande
mercado em potencial e essas pessoas também têm o direito a consumir roupas que
ficam bem nelas. Tem mercado e tem consumidor, mas para isso deve ter produto e
acesso.
Dariene Rodrigues
– Sim. Há desinformação por parte de alunos e profissionais da área de
moda sobre a temática da deficiência, além da importância dos conceitos do
desenho universal, da sustentabilidade, da autoestima e das atividades de vida
diária. É necessário a quebra de paradigmas, que as pessoas possam conhecer e
entender as necessidades das pessoas com deficiência e se sintam estimuladas a
desenvolver soluções funcionais e elegantes.
Silvana Louro – Não
se trata disso. Você tem de conhecer seu público, saber onde e como atendê-lo
de maneira inesquecível. Estou inserida no universo das pessoas com
deficiência, mas no passado senti o preconceito porque ninguém queria produzir
minhas roupas. Já fazem oito anos e hoje eu escolho quem vai me representar. Se
eu esbarrar em algum preconceito não vou ficar por dinheiro nenhum.Já tirei
minhas roupas de lojas físicas porque não me representavam. O alinhamento ao
meu conceito é imprescindível.
Hoje, participo de
feiras e exposições dentro da área de moda com minhas roupas adaptadas sem
nenhum problema. Estou no ‘Salão Inspira Mais’, em São Paulo, no setor de
inovação, estarei em várias outras, sempre com a moda inclusiva de frente.
Quanto ao potencial de
vendas, é preciso se perguntar: você está disposto? O mercado existe, você
precisa ir atrás dele. Ter um planejamento leva tempo, mas norteia seus passos.
Também precisa conhecer e amar seu público.
blogVencerLimites –
Quais os principais desafios para a evolução do setor?
Patrícia Sant’Anna
– Ter mais marcas de moda inclusiva que falem a linguagem da moda. Não é
só fazer roupa, é dar acesso aos mesmos tipos de linguagem que as pessoas sem
deficiência têm disponíveis.
Vitoria Cuervo
– Quem trabalha com isso são marcas pequenas. É difícil pensar em expandir
nossas marcas quando não temos verba o suficiente para isso, e também queremos
vender as peças com um preço que seja acessível a todos, uma roupa inclusiva em
todos os sentidos, mas fica muito dificil de pensar isso enquanto pequeno
empreendedor.
Então, para a evolução
do setor, a solução seria as grandes empresas, as lojas âncoras, as magazines
populares, abrirem os olhos e enxergar que existe a necessidade disso, que toda
essa luta não é em vão. Estamos aqui querendo nos juntar a elas e fazer a coisa
acontecer. Porque daí seria muito mais acessível em todos os sentidos, preço e
acesso à roupa, a sociedade começaria a entender e a olhar para o outro. Essa
seria um grande marco na história da moda inclusiva.
Ou então os governos
comecem a dar apoio aos pequenos. As empresas de tecido e aviamentos podiam
fazer um reajuste nos preços da matéria prima para quem trabalha nesse setor.
Enfim, a gente quer ganhar nosso espaço para esse mercado para que todos tenham
acesso à moda de forma igual.
Dariene Rodrigues
– Na esfera da criação, o desafio é encontrar soluções simples e comuns de
desing de roupas para características específicas de cada deficiência. Além da
escolha de tecidos e aviamentos. Já na esfera comercial, há barreiras e
preconceitos das empresas varejistas, principalmente por ser algo que nunca
tiveram de lidar, além do potencial de mercado.
Silvana Louro
– Abertura de mercado, engrossar a fila de quem acredita. Aqueles que têm
espaço precisam dar a mão para quem produz roupas adaptadas e também
proporcionar experiências positivas de compra nas suas lojas e pontos de venda.
Incluindo acessibilidade. Como um cadeirante vai entrar em um vestiário para
provar suas roupas? É tão óbvio. E as araras com os cabides lá no alto. Percebe
que é um todo? Precisa de vontade e sensibilidade. Não é preciso se tornar uma
pessoa com deficiência para entender as suas necessidades.
blogVencerLimites – É
possível comparar a realidade brasileira com o momento de outros países?
Patrícia Sant’Anna
– No Brasil somos bem avançados. O Concurso de Moda Inclusiva foi destaque
na Vogue Itália e, lá mesmo, não tinha quase esse tipo de ação. Nos Estados
Unidos há muitos esforços nesse sentido.
Vitoria Cuervo
– Não há diferença porque aqui já estamos nos movimentando e lá fora,
embora exista há mais tempo marcas adaptadas com lojas virtuais, concursos para
incentivar outros a pensar nisso foi aqui que tivemos.
Foi nos Estados Unidos
que marcas conceituadas viram necessidade e estão fazendo roupas inclusivas,
como a Tommy Hilfiger, que já está na sua segunda linha, e a outra americana,
Target, também lançou. Temos muita gente criativa aqui e não desistimos tão
fácil. Acredito que, em pouco tempo, poderemos ser pioneiros ou um dos
primeiros a fazer a coisa acontecer de verdade.
Dariene Rodrigues
– Não. O Brasil tem várias iniciativas, concursos e desfiles para
estimular o crescimento da moda inclusiva.
Silvana Louro – Não
acho possível fazer essa comparação. Demandaria tempo e estudos.
blogVencerLimites –
Quais são, se existem, as grandes potências da moda inclusiva, entre países,
empresas e pessoas?
Patrícia Sant’Anna
– Não existem grandes potências em termos de países e empresas. Talvez o
Brasil e as marcas que hoje atuam aqui sejam as mais avançadas, mas não tenho
dados para afirmar isso. Sem dúvida, temos que destacar duas pessoas, ambas
brasileiras.
Daniela Auler,
idealizadora do Concurso Moda Inclusiva, que hoje é internacional e
impulsionou muita gente a pensar sobre moda inclusiva no País, deu origem a
cursos sobre moda inclusiva que pensam diversos aspectos, de que maneira criar,
como pensar enquanto negócio, como é o varejo para moda inclusiva, etc. Faz um
trabalho pedagógico que contaminou escolas de moda de todo o País.
Outra pessoa é a Sheila
Gies, pesquisadora brasileira radicada na Alemanha que foi uma das primeiras
pessoas do mundo a fazer uma pesquisa em design e cultura material, unindo moda
e pessoas com deficiências. Seu trabalho pioneiro fez muita gente começar a
trabalhar com o assunto e pensar sobre moda para quem tem problemas de visão,
calçados para quem tem problemas nos pés, etc.
Vitoria Cuervo
– Acho que qualquer lugar do mundo pode ser, quando se tem um mínimo de
consciência e de amor ao próximo. Acho que temos grande potencial de fazermos
esse mercado existir de verdade. Temos que ter mais apoio de empresários,
políticas e abrir a cabeça das grandes marcas. Assim, seremos, sem dúvida, um
País inovador e inclusivo.
Silvana Louro – A
moda inclusiva está diluída em praticamente todos os países. É um movimento
mundial. No meu site, mais de 50% das visitas são da China. Faz parte. Eu tenho
uma preferência pela estilista Takafumi Tisuruta, da grife japonesa Tenbo.
Gosto quando as roupas adaptadas são alegres e joviais, leves e lindas.
Fonte: Estadão
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