Saiba como colaborar para a inclusão da pessoa com deficiência na faculdade

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Em 2017, o tema da redação do Enem levou milhares de estudantes a refletirem sobre os desafios para formação educacional de surdos no Brasil. Mas a luta para a inclusão e acessibilidade da pessoa com deficiência ainda é pouco discutida em grande parte das universidades no País. Assim como muitas outras reivindicações, essa questão também precisa de visibilidade e de mais participação social para que a mudança aconteça de forma significativa.

Na faculdade, diariamente nos deparamos com desafios financeiros, de convivência e com o aprendizado de conteúdos complexos. Para grande parte dos alunos, locomover-se ou fazer a leitura de um texto, por exemplo, não é nada limitante. Mas, para uma pequena parcela de universitários, esses desafios são muito maiores.

O Brasil é um dos países que mais possui leis bem estruturadas, que garantem o direito da pessoa com deficiência. Entretanto, há pouca vontade e comoção pública para que esses direitos sejam cobrados ou colocados em prática.

Quer saber como os estudantes e as instituições podem juntos colaborar para a inclusão? O primeiro passo é entender e se interessar pela causa. Mesmo que você não tenha nenhuma familiaridade com o assunto, você pode ser um agente de transformação na faculdade e, consequentemente, na sociedade.

Por isso, a Revista QB conversou com profissionais que atuam na área e com pessoas que enfrentam esses desafios diariamente.

Deficiência visual: como Gilmar se tornou advogado

Com o apoio da família e amigos, Gilmar concluiu o curso de Direito há 20 anos. Antes, ele teve que passar por um processo de reabilitação na instituição Dorina Nowill que, assim como muitas outras, colabora para ampliar a participação da pessoa com deficiência na sociedade. Após aprender a ler em braile, a caminhar com o uso da bengala, entre outras técnicas, ele conquistou uma independência maior, o que o fez acreditar que poderia ir mais longe.

Como advogado atuante, ele permaneceu fazendo cursos para aprimorar seu conhecimento na área e, mesmo depois de tantos anos, percebe que ainda tem muita coisa para mudar. Na época, a faculdade não tinha nenhum recurso e nenhum outro aluno com deficiência visual. Então, Gilmar se propôs a fazer o vestibular de forma oral, assim como foram feitas suas provas durante todos os anos de graduação.

A infraestrutura do prédio não era nada acessível, e ele contava com a colaboração dos colegas e do uso de técnicas para subir os dois lances de escada, todos os dias, para chegar até a sala de aula. Mas o colega cadeirante não tinha a mesma oportunidade.

Cadeirante: Viviane fez duas faculdades e chegou à pós-graduação

Viviane Alvarez (22), entende bem o que é isso. Sua deficiência atinge braços e pernas. Para ter mais autonomia, ela faz o uso da cadeira de rodas automatizada. Formada em 2017 no curso de Rádio e TV na Faculdade Cásper Líbero, ela chegou a estudar um período na Anhembi Morumbi e atualmente faz pós-graduação de Direção de Arte em Comunicação na Belas Artes. Entre todas as experiências que teve, o maior desafio foi a locomoção e a falta de acessibilidade em algumas áreas das faculdades.

Ao ser perguntada sobre em que as instituições deveriam investir para melhorar a qualidade de vida de estudantes cadeirantes, ela relata que as faculdades precisam oferecer pisos planos, sem degraus; rampas de acesso; elevadores e banheiros com tamanhos adequados; lugares para cadeirantes nos auditórios e mais sinalização. A estudante reforça: “não podemos esquecer que tem outras pessoas com deficiências diferentes, não tão comuns, e que também precisam ser atendidas”.

Inclusão: muito além das rampas

Elaine Rodrigues é formada em LetrasGestão de Pessoas e tem proficiência em Libras(Língua brasileira de sinais). Seu irmão é deficiente auditivo e, com a experiência que adquiriu durante os anos, ela acredita que a inclusão deve “oferecer o que o outro precisa para que a pessoa com deficiência possa ter os mesmos resultados que uma pessoa sem deficiência”. Acessibilidade, para ela, é mais do que rampas de acesso, é necessário trabalhar, principalmente, as barreiras atitudinais.

“A primeira coisa para ajudar é procurar saber como ajudar e não ter vergonha em perguntar”, afirma Elaine. Essa postura, que serve para toda a sociedade, serve principalmente para as instituições de educação. Tanto Elaine como Teresa Costa d’Amaral, que é superintendente do Instituto Brasileiro dos Direitos da Pessoa com Deficiência (IBDD), acreditam que o correto seria as universidades marcarem uma avaliação individual e, junto ao aluno, entender do que ele precisa, preocupando-se em dar suporte desde o primeiro dia de aula.

Minha necessidade é diferente da sua

Tanto Elaine como Teresa afirmam que cada pessoa e cada deficiência precisa de um tipo de suporte. Por isso, é de extrema importância que haja interesse e disposição em entender a necessidade particular de cada um, para que assim não ocorram equívocos, como a aquisição de algum material ou a contratação de profissionais que não atendam à real necessidade dos alunos com deficiência, da instituição.

No entanto, existem suportes que atendem a mais de uma deficiência, que é o caso de pessoas com mobilidade reduzida. A rampa de acesso, por exemplo, não serve só para cadeirantes, mas também atende o anão, o idoso e a pessoa acidentada que faz o uso de algum aparelho para se locomover, temporariamente.

Mas existem casos, como o da pessoa com deficiência auditiva, que as necessidades são diferentes. Algumas pessoas precisam de um intérprete e outras de não, uma vez que sejam adeptos à leitura labial.

Tecnologia Assistiva

Teresa reforça que há maneiras simples de atender a algumas demandas. Na internet, por exemplo, podemos encontrar ferramentas gratuitas ou com preços acessíveis para serem instaladas em laboratórios. Isso ajuda a pessoa com deficiência a participar de forma mais ativa das aulas ou se socializar mais com os outros alunos e professores.

Hoje em dia, existem aplicativos como Be My Eyes, que une pessoas com a visão perfeita e deficientes visuais; Ubook, que é uma audioteca com um acervo que conta com vários gêneros literários e mais de mil títulos; Giulia, um aplicativo que possui um sistema que traduz em sons o significado dos movimentos de quem está utilizando ao app, facilitando a comunicação entre surdos e pessoas que não conhecem a Libras.

Outra questão importante é a capacitação dos professores, que muitas vezes estão despreparados para receber esses alunos. Tanto a Viviane como o Gilmar perceberam isso. O que os ajudou foi a disposição dos educadores em ouvi-los e atendê-los, apesar dos poucos recursos ou suporte.

“Para não desistir e desanimar, também precisei contar com minha própria força de vontade”, Gilmar Toledo.

Durante as aulas, Gilmar fazia a gravação dos áudios e, às vezes, xerocava o caderno dos colegas. Em casa, para estudar, contava com a ajuda dos sobrinhos para ler todo conteúdo. Porém, hoje, as faculdades têm condições de oferecer materiais e tecnologias assistivas - dispositivos, técnicas e processos de apoio que dão assistência, ajudam na reabilitação e inclusão, melhorando a qualidade de vida de pessoas com deficiência -, além de profissionais adequados para determinadas deficiências.

Direitos e medidas inclusivas

Na época em que Gilmar estudou, não havia políticas afirmativas - atos ou medidas que visam a combater os efeitos acumulados em virtude das discriminações ocorridas no passado - e nem vigorava a lei de acessibilidade nas faculdades. “O que aconteciam eram algumas reivindicações nas reuniões”. Foi um desafio constante defender seus direitos, assim como ainda é nos dias de hoje. Para Teresa, o problema está na falta de vontade e interesse em cumprir a lei, que garante educação para todos e assegura a inclusão da pessoa com deficiência.

“Nós lutamos por um intérprete para um estudante, porque a faculdade não queria oferecer. Ganhamos a causa e a faculdade ofereceu, porém, só no primeiro semestre. Tivemos que lutar e passar por isso todo semestre, pois a faculdade não incluiu o trabalho contínuo”, conta Teresa.

O trabalho é árduo e há tentativas e insistências para que as instituições cumpram suas obrigações, entretanto a responsabilidade não se limita às faculdades, mas compete a toda a sociedade, incluindo os alunos que dividem o espaço com estudantes.

Compreender que há um distanciamento que exclui pessoas com deficiência é importante para que a nossa postura diante disso seja adequada.

Socialização

Diferente de muitos outros alunos, Viviane teve uma experiência tranquila no quesito inclusão e interação com amigos e professores. “Não sofri bullying na faculdade, a maioria das pessoas me respeitava e isso para mim já é o essencial”, conta segura e ciente de que nem todos estavam abertos para uma interação. Ela ainda afirma que “na faculdade, as pessoas são um pouco mais maduras, na pré-escola isso pode ser muito mais difícil”.

A estudante recém-formada também lembra atitudes simples que as pessoas poderiam ter para evitar alguns constrangimentos, além de facilitar o dia a dia durante o período que ela estava na faculdade. Alguns estudantes, por exemplo, usavam o banheiro acessível para trocar de roupa, por ser um local mais espaçoso e privado. Outro caso é quando, ao final das aulas, os colegas estavam ansiosos para ir embora e ela teve que esperar vários minutos para poder entrar no elevador, já que ninguém cedia o lugar. Por isso, é válida a regra de se colocar no lugar do outro.

“O que esperamos é chegar o dia em que a pessoa com deficiência irá entrar na faculdade como cada um de nós, com menos dificuldades”, conta Teresa, superintendente do IBDD.

Uma palavra de inspiração

Viviane acredita que ao ocupar espaços não acessíveis, isso faz com que os olhos da sociedade sejam abertos.

“Eu incentivo todas as pessoas com deficiência a ocupar lugares como esses - faculdades e universidades - cada vez mais. Que nós façamos cada vez mais o que pessoas sem deficiência fazem. Pois só saindo de casa e mostrando que podemos fazer coisas normais é que vamos fazer a mentalidade das pessoas mudar. O preconceito, muitas vezes, surge pela falta de informação. Nem sempre é por mal, mas é porque nunca viram - pessoas com deficiência - fazendo essas coisas. Precisamos mostrar que podemos fazer. É uma ação militante, principalmente para conscientizar. E claro, precisamos e podemos correr atrás dos nossos sonhos independentemente das limitações que a sociedade e a cidade impõe. Não deixem as coisas te limitarem!”.

“Ninguém precisa gostar de ninguém, mas precisa respeitar, seja a aparência, as limitações ou o gosto do outro”, Viviane Alvarez

E assim seguimos na esperança de ver e viver em espaços onde cada vez mais pessoas de todas as classes, dificuldades, orientação sexual e etnias possam conquistar, de igual para igual, o seu lugar ao sol.

Fonte: Quero Bolsa

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