Conheça o pizzaiolo brasiliense cego que inspirou Edson Celulari
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O ator
global interpretou um cozinheiro deficiente visual em Teu Mundo Não Cabe Nos
Meus Olhos a partir da observação de Junior Lopes
Sob a supervisão do Mestre Dudu Camargo, Junior serviu como instrumento de pesquisa para Edson Celulari |
A arte
imita a vida… Uma das frases mais clichês de todos os tempos é perfeita para
explicar a relação do filme Teu Mundo Não Cabe Nos Meus Olhos com o cozinheiro
Junior Lopes, de 58 anos. Estrelado por Edson Celulari, o longa nacional conta
a história de um pizzaiolo cego do bairro do Bixiga, em São Paulo. Na tentativa
de entender o universo dos deficientes visuais, o ator global veio à capital
conhecer o cozinheiro e compor o personagem Vitório.
MAIS SOBRE
O ASSUNTO
Crítica:
Teu Mundo Não Cabe Nos Meus Olhos é debate frio sobre a visão
Foram
necessários três meses de preparação para que Celulari pudesse dar vida a um
dos papéis mais desafiadores de sua carreira. “É um personagem diferente de
tudo que já fiz. Precisei engordar quase 20 quilos, busquei referências em
alguns atores norte-americanos, mas observar o Junior foi essencial. Usei muito
do gestual dele, descobri como ele sabia o ponto certo da massa e a hora de
tirar a pizza do forno”, contou o artista em entrevista ao Metrópoles.
O encontro
aconteceu em meados de 2016, quando Junior e Celulari foram apresentados pelo
chef Dudu Camargo, em uma das tantas visitas do ator a Fratelllo Uno (Asa Sul).
“Nem acreditei quando o Dudu disse que um ator gostaria de me conhecer, fiquei
um pouco nervoso, mas ele me deixou bem à vontade. É diferente cozinhar com as
pessoas observando cada movimento seu”, relembra o pizzaiolo.
Cozinhar
para recomeçar
Diferentemente do
ficcional Vitório – cego de nascença –, Junior perdeu a visão em um acidente de
carro, em 1983, quando tinha 23 anos. Durante mais de uma década, o então
funcionário do Banco do Brasil viveu uma batalha de idas e vindas a salas de
cirurgia, na tentativa de reverter o problema.
“Foi uma
fase difícil, passei por 35 operações, além de dois transplantes de
córnia”, relata o brasiliense. Nenhum dos procedimentos, porém, foi suficiente
para que o cozinheiro voltasse a enxergar, mesmo que parcialmente.
Em 2004,
durante um curso de orientação e mobilidade para deficientes visuais, Junior foi
convidado a participar de um workshop ministrado pelo chef Dudu Camargo. A
formação idealizava montar um restaurante às escuras, no qual os cozinheiros
(todos cegos) e os clientes (que seriam vendados) não enxergariam. “Aprender a
fazer pizza me veio como um novo fôlego de vida, me abriu muitas
possibilidades. Foi meu recomeço”, ressalta o pizzaiolo.
Os oito
meses de aulas renderam bons frutos, não só para os alunos. “Foi a maior
experiência da minha carreira. Aprendi muito com eles, como a sensibilidade de
cozinhar utilizando todos os sentidos. E, para a vida, de ser feliz com o que
temos”, afirma Dudu.
Mentor do pizzaiolo, o chef Dudu Camargo acompanhou de perto a superação de Junior |
Preconceito
Cozinhar, então,
tornou-se mais que um hobby e passou a complementar a renda da família. Ao lado
da esposa, a administradora Juliana Cardim, de 43 anos,
Junior começou a comercializar pizzas congeladas. “Cheguei a
vender cerca de 800 pizzas em menos de 15 dias. As pessoas sempre elogiavam o
sabor, mas havia sempre aqueles clientes descrentes se eu era mesmo o
mestre-cuca”.
Para Junior,
o filme quebra preconceitos e mostra que os cegos são independentes e capazes
de fazer qualquer coisa. “Quando alguém fala que a minha pizza é feita por um
deficiente, corrijo e falo: ‘foi feita por uma pessoa eficiente'”, garante.
“Disse ao Celulari que vou conferir se ele me representou bem”, completa.
Cozinhar é uma terapia para Junior Lopes |
Se
depender das boas intenções de Celulari e do diretor Paulo Nascimento, o
brasiliense ficará bastante satisfeito. “Queríamos mudar essa imagem que as
pessoas têm dos cegos. Falamos de liberdade, de aceitação, de deixar os
indivíduos livres para serem como gostam”, considera o ator.
De acordo
com o cineasta, a inspiração para o roteiro surgiu a partir do relato da sócia
e produtora executiva do longa, Marilaine Castro da Costa. Ela contou
sobre cegos de nascença que tinham a possibilidade de enxergar, passavam
por cirurgias e, depois de não se adaptarem, faziam a reversão.
No
processo, descobrimos que os caras são muito mais bem resolvidos que as pessoas
ao redor deles. Mesmo não fazendo por mal, alguns familiares se acham no
direito de interferir nas escolhas dos cegos". Paulo
Nascimento
Assim como
na ficção, Junior está na fila para um transplante de células-tronco,
procedimento que promete, enfim, devolver-lhe parte da visão. “Sempre me
pergunto se quero mesmo passar por isso. Estou completamente adaptado, levo uma
vida normal. Como a espera pode demorar, tenho muito tempo ainda para decidir”,
explica. Independentemente da decisão, o cozinheiro não abrirá mão do seu maior
sonho: “Quero ter meu próprio restaurante”.
Fonte: Metrópole
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