Ciça Melo fala da atuação do Paratodos em busca de uma sociedade mais inclusiva
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Ciça Melo: “Atuamos em três frentes. A primeira é sensibilizar. Trazer o assunto das pessoas com deficiência para o cotidiano de todos” |
Lucas
fez a jornalista Ciça Melo, de 44 anos, repensar sua escolha profissional. Ela
trabalhava como diretora de marketing da Redecard e fazia mestrado em
Psicologia Comportamental com o objetivo de incentivar as pessoas a gastar
mais. Com a chegada do primeiro filho, há 12 anos, achou que não fazia mais
sentido incentivar o consumismo e migrou para o terceiro setor: virou
coordenadora de marketing da Apae-SP. Atuou ainda como voluntária na Fundação
Dorina Nowill e na Casa do Sol, e é conselheira da ABBR e uma das diretoras do
Instituto Lecca. Mais tarde, ela teve Luiza, de 11 anos, e Daniel, de 8. O
caçula, que não tem um diagnóstico definido, estudava na mesma escola dos
filhos da jornalista Fabiana Ribeiro (um deles, Vítor, nasceu sem íris) e da
arquiteta Carla Codeço (um deles, Rafael, têm síndrome de Down). As três
percebiam o desconhecimento da sociedade sobre a questão da deficiência e
criaram, em 2013, o Movimento Paratodos (paratodos.net.br). Em meio ao trabalho
de conscientização, exibem filmes seguidos de debates e promovem conversas. O
próximo evento é terça que vem, na livraria Blooks, tendo como convidada Denise
Aragão, autora de “Eu, meu filho e o autismo: uma jornada inesperada”.
REVISTA
O GLOBO: De que forma age o Movimento Paratodos?
CIÇA
MELO: Atuamos
em três frentes. A primeira é sensibilizar. Trazer o assunto das pessoas com
deficiência para o cotidiano de todos. Disseminar a cultura de uma sociedade
mais inclusiva, que saiba lidar com as diferenças. Mudar esse olhar, que ora é
de pena, ora assistencialista, ora paternalista, que desconsidera o indivíduo e
não percebe sua potência. Você vê alguém com cadeira de rodas na rua e se
aproxima para ajudar. Mas ele está precisando de ajuda? Fazemos isso por meio
de palestras e rodas de conversa em empresas, ONGs, escolas, junto a autoridades
e até nas casas. Já sensibilizamos desde os educadores de uma creche até todos
os coordenadores de curso da Facha. A segunda frente é a consultoria. Engloba
desde o ponto de vista arquitetônico até pedagógico. Exemplo: um empresário nos
disse que queria contratar uma pessoa com deficiência. “Mas tem vaga?”,
perguntamos. “Não, mas ela fica lá.” Dissemos que seria melhor a gente avaliar
a empresa para que aquela contratação fosse efetiva. Senão o funcionário ia
ficar desmotivado. E isso ia reforçar o olhar dos outros de que ele não é capaz
de nada.
Como
tem sido a procura por parte das escolas?
Cada
vez maior. Só nessas últimas duas semanas estivemos em cinco. Graças a esse
trabalho, a Eleva, por exemplo, tem desde placas em braille até acessibilidade
para cadeiras de rodas. No total, foram mais de 150 professores e gestores
sensibilizados para atuar de forma diferente, olhando o que cada indivíduo pode
avançar naquele ano. Se o tema é temperatura, por exemplo, posso ter alunos
trabalhando a conversão de Celsius em Fahrenheit, ou estudando os estados
físicos da água ou o quente e o frio. O professor tem que querer olhar a
criança para além da deficiência. E agora vamos sensibilizar um grupo de pais.
Desde 2003 já estivemos em 41 escolas, empresas e ONGs, impactando 700 pessoas.
E
a terceira frente de atuação?
O
professor é o principal agente de mudança na escola. Então criamos o prêmio
Paratodos de Inclusão Escolar. A segunda edição será lançada este mês, e as
inscrições vão de outubro a dezembro, contemplando as ações de 2017. A
vencedora de 2016 foi a professora Ana Floripes, do Colégio Estadual Igléa
Grollmann, em Cianorte (Paraná), que criou estratégias para incluir vários
alunos com deficiência na mesma turma.
Como
está a situação nas escolas?
Em
termos de legislação, estamos bem amparados, com a Lei Brasileira de Inclusão (que
entrou em vigor ano passado e obriga as colégios privados a acolher estudantes
com deficiência). Mas há escolas que não aceitam, o que sobrecarrega
outras. Por isso, acreditamos na conscientização, na mudança de olhar. Você não
tem uma inclusão efetiva se no recreio as demais crianças não incluem e se no
fim de semana os outros pais não ajudam no processo, levando, por exemplo, a
criança com deficiência ao cinema junto com seu filho. Nem sempre é fácil
incluir, são vários os obstáculos, mas o prêmio Paratodos, que reconhece as
principais experiências pedagógicas inclusivas, mostra que é possível. Não
acreditamos em educação para alguns. Lutamos por um mundo sem preconceitos, sem
limitações, sem rótulos, onde ninguém fica para trás.
Fonte:
O Globo
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