Sem visão, lutador de RO supera limites e aprende jiu-jítsu pelo tato
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Esporte trouxe um novo sentido para a vida do
garoto, que sonha em se tornar lutador profissional. A deficiência veio ainda
quando criança, mas não o impediu de lutar.
Por Franciele do Vale Ariquemes
Sensei Russo Pereira com Lucas, em Ariquemes
(Foto: Franciele do Vale)
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Aos quatro anos de idade, o mundo em volta de
Lucas Eduardo Martins, de 14 anos, se transformou em vultos e flashs de luz. A
falta de visão fez com que ele conhecesse a vida através do tato. Com o toque,
Lucas diferencia os objetos, a mobília da casa e escolhe suas roupas. Foi
também pelo toque que ele aprendeu a lutar jiu-jítsu, o esporte que mudaria
radicalmente sua vida.
O garoto de sorriso fácil e porte físico de
atleta, nem de longe lembra o menino acima do peso e triste que há cerca de
três anos chegou à academia de jiu-jítsu, do sensei Russo Pereira, que teve a
grata missão de ensinar a arte marcial para Lucas. O método de ensino foi
diferenciado e lento, mas a cada golpe novo que o jovem aprendiz realizava com
sucesso, a relação professor e aluno ia seguindo além do tatame.
Foi um desafio pra mim no começo porque eu
não tinha ideia de como ensiná-lo. Foi meu primeiro aluno cego e acredito que
na nossa região foi pioneiro. Não tinha uma referência para me basear e eu tive
que descobrir tudo. Foi quando notei que o tato dele era muito aguçado e tinha
uma excelente memória fotográfica. Para ensinar um golpe a Lucas, eu me
posiciono, ele me toca e depois reproduz o movimento. É preciso ter paciência,
vontade e também requer experiência por parte do professor - conta o sensei.
Com o passar do tempo, Lucas desenvolveu
habilidade para o esporte. Foi uma fórmula perfeita, como feitos um para o
outro. Quem conhece, garante: ele é um aluno dedicado e disciplinado. O sensei
acredita ainda que a sensibilidade do jovem adquirida pela falta da visão fez
com que o garoto tivesse capacidade de absorção maior ao que lhe foi ensinado.
Para Russo, trabalhar com Lucas foi um desafio, mas também uma experiência que
ele deve levar para toda vida.
O desafio de ensinar movimento a movimento
através do tato para um garoto cego representa que a fronteira do espírito
humano está mais além. Cada um marca sua fronteira, mas se eu achar que posso
ir além, eu vou cada vez mais longe. Dessa experiência tirei uma lição de vida.
- comenta.
O respeito e admiração faz parte dessa
relação. Com amor e confiança, em 2014 Lucas disputou o Campeonato Estadual de
Jiu-Jítsu e lutou contra um garoto que enxerga. Dentro do tatame foi o grande
campeão e levou a medalha de ouro. O campeonato, então, aguçou a vontade do
garoto de ser lutador profissional.
Não tive nenhuma dificuldade em lutar contra
alguém que enxerga. Foi muito tranquilo pra mim e normal. Quero participar de
mais campeonatos e ganhar experiência para construir uma carreira no jiu-jítsu.
Meu sonho é ser profissional destaca.
Com essa vontade, Lucas pode chegar longe, ou
ir para bem longe. Em abril deste ano ele participa de uma seletiva que deve
acontecer em Manaus, para participar de um campeonato de em Abu Dhabi, nos
Emirados Árabes. Porém, nesse campeonato ele deve lutar com garotos na mesma
condição dele, segundo o sensei Russo.
Vida em família
Lucas conta que o maior sonho é voltar a
enxergar e ver os pais
(Foto: Franciele do Vale)
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A família é a base da vida de Lucas. Ela é
formada por pessoas que sempre estiveram ao seu lado, principalmente nos
momentos difíceis causados pela perda precoce da visão. Morando com a avó, dona
Juraci Faustino e com o pai José Antônio de Jesus, numa casa no Bairro Setor 5,
em Ariquemes, ele enfrenta as dificuldades de viver com poucos recursos, como
milhões de brasileiros. O local é simples, mas de uma delicadeza única e
reflete o toque de carinho de dona Juraci. Nesse ambiente repleto de amor,
Lucas cresceu. Com os olhos marejados, a doce avó explica como o neto perdeu a
visão.
Ele herdou a catarata congênita do pai. Fez
quatro cirurgias mal sucedidas e na última teve descolamento na retina, o que
ocasionou a falta de visão irreversível ainda quando tinha quatro anos de
idade. Foi muito difícil para toda a família porque ele era uma criança ainda,
mas graças a Deus hoje está bem e é menino muito bom - elogiou a avó.
Lucas conta que a cegueira não é completa, já
que ele enxerga vultos e consegue localizar as coisas que estão a sua volta. E
se pudesse voltar a enxergar, está na ponta da língua o que ele mais sonha em
ver de forma nítida e clara.
Ver o rosto da minha avó e do meu pai é meu
maior sonho. São pessoas muito importantes na minha vida e sou grato a eles -
disse.
Fonte: Globo Esporte e Blog APNEN Nova Odessa