Neurociência e robótica caminham para melhorar vida de pessoas com paralisia
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Projetos milionários
em diferentes países se propõem a superar um dos maiores desafios da ciência.
Quando o paraplégico Juliano Pinto deu o pontapé inicial da Copa no último dia 12 de junho, o mundo
pôde vislumbrar o ritmo acelerado com que a neurociência e a robótica estão se unindo nas pesquisas
que buscam melhorar a qualidade de vida de pessoas com diversos tipos de paralisias e dificuldades de mobilidade.
De um lado,
neurocientistas como o brasileiro Miguel Nicolelis — pesquisador da
Universidade Duke, nos EUA, e responsável pelo projeto Andar
de Novo, que resultou no chute histórico à beira do gramado do
estádio do Itaquerão — avançam cada vez mais rápido no desenvolvimento de
métodos que permitem controlar diversos tipos de equipamentos apenas com a
força da mente. Mas de outro, engenheiros e especialistas ainda lutam para
superar os obstáculos na construção de exoesqueletos leves, práticos e baratos
que possam sair dos laboratórios e hospitais e tornar uma realidade para o
maior número de pessoas possível a capacidade de realizar ações como o pontapé
pioneiro de Juliano.
— Neste momento,
o grande desafio é criar um sistema que tenha autonomia fora do laboratório, e
aí o principal problema não é da neurociência e das interfaces cérebro-máquina,
mas da robótica — avalia Nicolelis. — Infelizmente, a robótica que temos de
verdade não é a que vemos nos filmes. Os robôs de Hollywood não existem, são
simples marionetes ou criações digitais. Do ponto de vista da neurociência,
robôs e exoesqueletos controlados pela mente não são mais uma ficção, mas ainda
estamos limitados pelo que a robótica pode fazer.
Isso não quer
dizer que a robótica não esteja também dando os primeiros passos para tirar os
exoesqueletos da ficção e levá-los às ruas. No fim de junho, menos de três
semanas após a demonstração de Nicolelis na abertura da Copa, a FDA, agência
americana que regula alimentos e medicamentos, deu sinal verde para
comercialização nos EUA de um exoesqueleto desenhado para permitir que pessoas
paraplégicas andem. Produzido pela empresa israelense ReWalk Robotics, fruto de
mais de dez anos de pesquisa e desenvolvimento, o equipamento é o primeiro do
tipo a ser oferecido ao público em geral.
Mas, assim como
seus principais concorrentes ainda restritos às clínicas de reabilitação, o exoesqueleto
ReWalk é caro, pesado, desajeitado e tem autonomia limitada. Na Europa, onde já
estava disponível desde 2012, o produto é vendido por cerca de US$ 70 mil. Além
disso, para usar o dispositivo o paciente deve poder mover mãos, braços, ombros
e a parte superior do corpo e estar em boas condições físicas para enviar os
comandos que fazem o exoesqueleto levantar, caminhar, virar e sentar-se, e
recorrer a muletas para manter o equilíbrio.
Dispositivo já é
alugado no Japão
Em linha semelhante à do ReWalk, está o sistema japonês HAL (sigla em inglês
para “assistência híbrida aos membros”). Produzido pela empresa Cyberdyne, foi
inicialmente projetado para aumentar a força nas pernas de pessoas com
problemas de mobilidade ou que necessitam carregar peso por longas distâncias.
Nestas primeiras versões, a veste robótica dependia da captação de impulsos
nervosos enviados do cérebro para as pernas para ser acionada, o que impedia
seu uso por paraplégicos. Mas, com a instalação de controles manuais, isso se
tornou possível. A Cyberdyne, no entanto, oferece o produto apenas no Japão e
só por meio de aluguel, a um custo aproximado de R$ 12 mil a título de “taxa de
instalação” e com mensalidades que variam entre cerca de R$ 3,5 mil e R$ 4,1
mil, dependendo da duração do contrato.
Outra novidade
neste campo, que só será tornada pública na próxima semana, na Itália, vem do
laboratório da Universidade da Califórnia em Berkeley. O projeto, liderado por
Homayoon Kazerooni, também fundador da empresa Ekso Bionics, busca justamente
desenvolver um exoesqueleto para os membros inferiores de paraplégicos que seja
o mais leve, simples e barato possível, algo que pese em torno de dez quilos,
custe por volta de US$ 20 mil e possa ser usado sob as roupas. Como Kazerooni é
um dos pioneiros e mais respeitados pesquisadores da área, é grande a
expectativa pela sua apresentação.
— Muitos
paraplégicos não têm condições de pagar US$ 100 mil — justifica. — Nosso
trabalho como engenheiros é fazer algo que as pessoas possam usar. E é mais
complicado construir um Honda do que um Porsche. Não é difícil acrescentar cada
vez mais sensores e maquinário. A questão é saber que desempenho se pode obter
com o mínimo possível.
Métodos menos
invasivos se sofisticam
Enquanto isso, os neurocientistas caminham para dar aos usuários dos
exoesqueletos do futuro um controle cada vez mais preciso e confiável dos
movimentos apenas com a força do pensamento. Atualmente, os métodos não
invasivos, como a espécie de touca com eletrodos usada por Juliano no chute inaugural
da Copa, conseguem captar com alto índice de acerto, acima de 90%, comandos
suficientes para operar um sistema semiautônomo que, por exemplo, traduza a
ordem para andar em movimentos alternados das pernas e dos pés. Já os métodos
invasivos, como o implante de chips no cérebro, podem ler uma gama maior de
pensamentos, permitindo a realização de tarefas mais complexas e delicadas,
como fazer um braço robótico agarrar um copo e trazê-lo ao alcance da boca.
— Esse campo está
avançando tão rápido que está excedendo as próprias expectativas da comunidade
científica — comenta Bin He, professor da faculdade de Ciências e Engenharia da
Universidade de Minnesota, onde trabalha no desenvolvimento de interfaces
cérebro-máquina. — O que era considerado impossível há dois anos hoje é
realidade.
Fonte: O Globo
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