Por mais bom senso inclusivo e acessibilidade no serviço público
Compartilhe
FOTO 01: Thiago Helton
em uma secretaria de juízo aguardando atendimento em frente a uma mesa.
FOTO 02: Imagem de um
balcão alto e sujo visto da altura de um cadeirante.
|
Enquanto lutamos pelo
desenho universal, medidas simples dos gestores públicos podem promover um
atendimento mais digno para pessoa com deficiência nas organizações
públicas.
A garantia da dignidade
no atendimento aos profissionais e pessoas com deficiência nas mais diversas
organizações públicas passa necessariamente pela compreensão e gestão
inteligente do direito à acessibilidade plena.
Contudo, mesmo se
tratando de uma pauta primordial e que possui farto amparo em nosso ordenamento
jurídico, com inúmeras leis e instrumentos normativos, as barreiras de acessibilidade
ainda são frequentes em diversos órgãos e entidades públicas.
E a nossa luta segue
incansável para evidenciar as mazelas, dialogar, propor soluções, chamar
atenção dos gestores públicos quanto à necessidade de enfrentamento e eliminação
das mais diversas barreiras.
E aqui vale lembrar que
a LBI trouxe o conceito legal de “barreiras” firmando um parâmetro
exemplificativo daquilo que deve ser eliminado.
Nos termos do art. 3º, V
da Lei 13.146/2015, barreiras são qualquer entrave, obstáculo, atitude ou
comportamento que limite ou impeça a participação social da pessoa, bem como o
gozo, a fruição e o exercício de seus direitos à acessibilidade, à liberdade de
movimento e de expressão, à comunicação, ao acesso à informação, à compreensão,
à circulação com segurança, entre outros.
Trazendo para a prática,
apresento um simples exemplo da minha rotina na advocacia para mostrar a vocês
como muitas das vezes falta a compreensão da dimensão do conceito de
acessibilidade dentro das repartições públicas.
Na primeira foto, estou
aguardando atendimento na secretaria de juízo de uma das Unidades
Jurisdicionais do Juizado Especial da Fazenda Pública em Belo Horizonte. Na
segunda foto estou aguardando atendimento em uma das Varas de Família no Fórum
Lafayette em Belo Horizonte (aqui fiz questão de mostrar a “bela vista” do
advogado cadeirante).
Para quem não conhece,
esses são dois ambientes de atendimento a partes e advogados na 1ª Instância do
Tribunal de Justiça de Minas Gerais, porém em prédios distintos.
Você consegue perceber a
simples diferença de trocar um balcão alto por uma mesa? Uma simples alteração
de layout que promove dignidade na rotina do advogado ou do cidadão em cadeira
de rodas, com nanismo, baixa estatura ou que, por alguma razão, não possa ser
atendido em pé.
Isso sem entrar no
mérito do desenho universal que é o nosso alvo maior. Nem mesmo as consideradas
adaptações razoáveis o Poder Público está conseguindo cumprir.
Se ainda enfrentamos
dificuldades com o enfrentamento de barreiras que podem ser eliminadas com uma
simples mudança de layout ou uma releitura de mobiliário das repartições
públicas, imagina para situações que demandam um enfrentamento com a criação de
soluções mais complexas?
Quantos não são os
advogados cegos que perderam sua autonomia profissional por falta de
acessibilidade nas inúmeras plataformas de processos judiciais eletrônicos?
Quantos não são os
profissionais surdos e pessoas com deficiência auditiva que pelejam dentro dos
estabelecimentos públicos em busca de informações e de atendimento digno?
Até quando vamos ver
notícias de gente se rastejando pelas escadarias de autarquias federais para
serem atendidas entre outras aberrações do tipo que sequer chegam ao
conhecimento público?
Além de ser um direito e
uma garantia em si, a acessibilidade plena é um instrumento de
efetivação de diversos direitos fundamentais, sendo passagem necessária
para a vida digna do cidadão com deficiência.
Não custa lembrar que,
antes mesmo de se discutir o descumprimento da legislação infraconstitucional
de acessibilidade, o Brasil é signatário da Convenção Internacional sobre os
Direitos das Pessoas com Deficiência que obriga todos os Poderes Públicos
(Executivo, Legislativo e Judiciário) ao seu fiel e efetivo cumprimento.
O referido diploma
internacional tem força normativa constitucional no ordenamento jurídico
brasileiro e consagra a proteção do direito à acessibilidade, a fim de
possibilitar às pessoas com deficiência viver da forma mais independente
possível e participar plenamente de todos os aspectos da vida, em igualdade de
oportunidades com as demais pessoas, estabelecendo uma série de obrigações e
medidas a serem tomadas pelos Estados Partes.
Vale destacar que os
danos gerados pela omissão na promoção do direito à acessibilidade, sobretudo
nas organizações públicas, são juridicamente passíveis de gerar indenização,
sem prejuízo das eventuais repercussões administrativas e criminais, conforme
as circunstâncias caso.
Em minha saga na
advocacia já foram inúmeros os casos de judicialização da falta de
acessibilidade com situação de danos morais e até materiais sofridos por
pessoas com deficiência nas mais diversas situações.
Lembrando que o direito
à acessibilidade deve ser promovido tanto pelo setor público, quanto pelo
privado, repercurtrindo juridicamente com o mesmo peso. Mas o post de hoje é
pra chamar atenção especificamente do Poder Público, que tem o papel de
fiscalizar e sequer cumpre o seu dever de casa.
Cartilha sobre
acessibilidade nas organizações públicas
Recentemente, a Rede de
Acessibilidade, da qual o Supremo Tribunal Federal (STF) faz parte, lançou a
cartilha “Como
Construir um Ambiente Acessível nas Organizações Públicas”.
A iniciativa reuniu a
cúpula dos Poderes Judiciário e Legislativo e o Tribunal de Contas da União
(TCU), sendo que a Rede de Acessibilidade promove discussões sistemáticas
relacionadas à acessibilidade e à inclusão de pessoas com deficiência
dentro das instituições.
Espero de coração que
iniciativas como essa comecem de fato a surtir efeito dentro das organizações
públicas.
Um bom começo seria um
mutirão de mudanças de layout e adequações de mobiliário que, na maioria dos
casos, não geram impacto econômico relevante nas contas públicas e dependem tão
somente de vontade de fazer e bom senso inclusivo.
Precisamos cada vez mais
de medidas educativas para promover a mudança de mentalidade na Administração
Pública acerca do direito à acessibilidade e eu valorizo as diversas ações que
já existem nesse sentido.
Contudo, sem prejuízo de
medidas dessa natureza, até que se alcance a efetividade do direito à
acessibilidade plena, faz-se necessária a criação de medidas punitivas
inteligentes, com caráter pedagógico para combater as omissões e práticas
ofensivas à dignidade do cidadão com deficiência.
Chega de balcão.
Nenhum comentário:
Postar um comentário
Seu Comentário é muito importante para nós.