A Solidão das Mães de Crianças com Deficiência
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Para o crescimento e
desenvolvimento saudável de uma criança com deficiência, são necessários anos
de sacrifícios e dedicação dos seus responsáveis que devem, além de lidar com a
ausência de acessibilidade e políticas públicas, suprir as lacunas físicas e
emocionais da criança, atender às especificidades da deficiência e
enfrentar os preconceitos da sociedade em geral.
Quando se é mãe de
uma criança com deficiência, os desafios da criação são multiplicados.
Para atender aos seus
filhos, é comum que os pais coloquem em segundo plano os seus projetos
individuais. Mais comum ainda, é que as responsabilidades fiquem à cargo da mãe
da criança e ela deixe de ser protagonista da própria vida.
Para exemplificar as vivências diárias dos cuidados, mães de crianças com
deficiência falam sobre a solidão experienciada cotidianamente.
Maira Oliveira
“É muito difícil a vida
da mãe de uma criança que tem deficiência, o meu filho tem Transtorno do
Espectro Autista (TEA). Hoje mesmo, fui comprar um sanduíche para ele comer, e
todos ficaram olhando porque eu passei na frente, já que temos direito à fila
preferencial.
Então, ele passou mal, vomitou, todos olharam feio. Eu sempre sinto em uma
obrigação desnecessária de ficar pedindo desculpas para as pessoas por alguma
situação que aconteça, por alguma dificuldade que o Felipe tenha, por algum
comportamento diferente.
Eu não tenho mais amigas, já tiveram pessoas que disseram que não queriam mais
a minha amizade por causa do meu filho, do comportamento dele. Tem pessoas que
acham que eu tinha que bater nele, que ele é mal educado ou mal criado, e não é
nada disso. A minha própria sogra disse que o meu filho não é bem vindo na casa
dela.
Chamam o meu filho de violento, porque ele tem os repentes. Então, é bem
complicado... Se eu vou em um passeio, conto apenas com meu marido e meus
filhos, ninguém quer a nossa companhia”.
Lara Paulo
“A solidão da mãe de uma
criança com deficiência é estar sempre sozinha, mesmo que em meio à multidão.
Uma mãe especial dorme e acorda pensando em algo novo para agregar qualidade de
vida e desenvolvimento para o seu filho.
A mãe especial faz tudo que uma mãe típica faz, porém, sozinha. As pessoas se
afastam devagar. A solidão não é concreta, ela tem amigos, família, esposo e,
claro, filhos. Sua solidão está escondida em pequenas ações, quando alguém sem
conhecimento diz que seu filho tem ‘problema’ e ela já está tão esgotada, que
só olha e não responde.
Essa solidão se encontra nos monólogos que têm com os seus filhos com
deficiência, afinal, eles entendem, porém, não respondem. Quando o corpo dá
sinais de colapso, dores e a mãe especial não tem tempo para ir ao médico, ela
não tem com quem deixar os filhos, ela precisa levá-los na terapia. A mãe
especial não tem com quem contar, não tem para quem contar.
Vítima não! Deus não castiga! A mãe de uma criança com deficiência é
privilegiada por ter a oportunidade de ver, ouvir, sentir e ser o mundo de
forma diferente. A solidão da mãe especial é consequência, mas, às vezes, é
opção”.
Luciana Soares
“Tenho uma filha de três
anos, a Emanuela, que tem paralisia cerebral. A minha história é que, do
segundo ao quarto mês, eu tive sangramento e, até então, eu não sabia que ela
seria especial e nenhum médico disse que ela poderia ser.
Depois que ela nasceu, houve uma suspeita de microcefalia, fizemos todos os
exames e foi diagnosticado paralisia cerebral. A forma como o médico abordou a
deficiência ela ao me contar, dizendo que ela era um presente de Deus, fez com
que eu aceitasse com mais facilidade.
Então, procurei tratamento e hoje ela está muito bem. Frequenta uma instituição
especializada, começou a querer rolar, entender as coisas, a visão dela
melhorou muito. À cada dia que se passa, tem acontecido muita coisa. Mas ainda
tenho problema para lidar com outras pessoas que, ao invés de te ajudar e te
fortalecer, são as primeiras a te colocar pra baixo, a questionar sobre o que
você vai fazer com ela ou te culpar.
Antes de ter ela, eu tive um aborto e engravidei oito meses após, então, as
pessoas me culparam e isso quase me levou à uma depressão. Antes eu andava com
o carrinho, depois, comecei a andar com uma cadeira de rodas para as pessoas
olharem menos, e ainda tem o preconceito da própria família. Hoje, eu sou uma
pessoa mais isolada, mas não totalmente, eu busco fazer novas amizades”.
Franciele Marcanzoni
“Eu tenho 35 anos, sou
mãe de um menino que possui Transtorno do Espectro Autista e tem nove anos, e
essa solidão é uma coisa muito presente na vida de todas as mães. De uma forma
ou outra, na vida de uma mãe de criança especial, ela tem uma presença um pouco
mais constante, porque tu tem aquela incompreensão, aquela falta de empatia das
pessoas, da própria família, na escola.
O primeiro ponto, é que eu sempre trabalhei, tinha uma carreira muito boa, um
cargo executivo em uma grande empresa, mas parei de trabalhar porque meu filho
precisa de um acompanhamento, tem uma rotina de terapias. E a única pessoa a
fazer isso sou eu, não tenho uma rede de apoio, o meu núcleo familiar sou eu,
meu esposo, o meu filho que possui autismo e um bebê de dois anos.
Ser mãe de uma criança com deficiência é muito limitante, meu filho tem uma
socialização difícil, então, eu não consigo deixar ele em uma brinquedoteca
para fazer uma atividade, não consigo sair para jantar com meu marido, criar
laços de amizade, porque meu filho tem dificuldade de ir em alguns lugares, se
relacionar com outras crianças, ele tem uma seletividade para relacionamentos,
então, acabamos ficando apenas em nosso núcleo familiar.
Eu moro em Campo Grande há três anos, não tenho amizades aqui, não temos
um círculo de amigos, nosso círculos somos nós mesmos, passamos por situações
de complicações, os outros pais acham que ele é mal educado e tiram as crianças
de perto dele, então, nós criamos alguns escudos. Sem perceber, é algo
inconsciente, mas criamos esse desvínculo das outras pessoas.
De certa forma, já estou designada a viver essa solidão. Hoje, o meu filho está
muito melhor, mas ainda tenho essa dificuldade. Gostaria de voltar a trabalhar,
mas tenho essa rotina com ele, e me sinto muito sozinha”.
Esse artigo é de autoria da nossa amiga Sarah Santos, não
copie ou publique esse texto sem a autorização da autora!
Fonte: Sarah Santos
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