Diante da violência, mulheres com deficiência são ainda mais vulneráveis
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“Tem gente que me pergunta o que eu estou fazendo no trem naquele horário. Ficam perplexos ao ouvir a minha resposta, quando explico que estou voltando do trabalho. Isso também é uma violência” |
Neste dia 25 de novembro, Dia Internacional da Não-Violência Contra a Mulher,
pouco temos a comemorar e muito a trabalhar para a minimização dos riscos e
danos. Embora a subnotificação nos números, principalmente devido à dificuldade
da mulher com deficiência vitimada denunciar os maus-tratos, as estatísticas
mostram que, em São Paulo, crianças, jovens e mulheres adultas são maioria das
vítimas dos crimes sexuais, que afetam principalmente pessoas com deficiência
intelectual.
Apesar
dos esforços para garantir a equidade de gênero, as mulheres ainda são alvo das
inúmeras formas de violência, que vão da discriminação ao feminicídio.
Curiosamente, foi a experiência e a coragem de uma mulher com restrição de
mobilidade que culminou numa das mais importantes legislações para o combate à
violência contra a mulher do mundo: a Lei Maria da Penha (Lei 11.340/06).
Violência contra Pessoa Com Deficiência na capital
paulista
Entre
os anos de 2014 e 2018 foram registrados pela Secretaria de Segurança Pública
do Estado, 15.770 atendimentos a Pessoas com Deficiência. Apesar de serem
numericamente inferior aos homens no registro formal dos Boletins de Ocorrência
(41,2%), as mulheres representam 63,4% das vítimas de crimes sexuais.
Os
adolescentes totalizaram 73,6% dos casos de abusos, as crianças da 2ª. Infância
18,3% e na faixa etária da 1ª infância 8,1%. Em sua maioria (68,9%) as vítimas,
de ambos os sexos, têm deficiência intelectual.
Vale
ressaltar que a mensuração mapeada pelo Observatório
Municipal da Política da Pessoa com Deficiência baseou-se nas queixas
registradas formalmente. Ou seja, o universo conhecido é apenas parte de um
problema encoberto pelo “véu da invisibilidade”, consequência do isolamento
causado pelas condições limítrofes.
O
“Programa de Enfrentamento à Violência contra Mulheres Brasileiras com
Deficiência” foi destaque durante a 10ª Conferência dos Estados Partes
Signatários da Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Pessoa com
Deficiência da ONU. Foi mostrada, então, a experiência do Plano Nacional de Prevenção e Combate à Violência,
a partir da experiência no estado de São Paulo. A capital paulista foi a
primeira a contar com uma delegacia especializada no atendimento à Pessoa com
Deficiência, inaugurada em 2014.
Vulnerabilidade aumenta o Assédio
Devido
à poliomielite adquirida quando criança, a cadeira de rodas possibilita Ivone
Gomes de Oliveira de circular pela capital paulista. O trajeto entre a casa e o
trabalho e o lazer é feito de transporte público. Ativista da causa em defesa
dos direitos da Pessoa com Deficiência, a “Gata de Rodas”, como ficou
conhecida, também milita pela diversidade sexual.
Ela
conta ser vítima comum de assédio sexual quando é passageira em transportes
públicos. “Parece que o fato de ser diferente nos faz mais vulnerável e sempre
tem alguém que dá um jeito de tocar o nosso corpo”, reclama. Apesar de
independente, ela tem evitado andar de transporte público sozinha.
A
situação mais grave aconteceu há cerca de um ano e meio, quando viajava no
primeiro vagão do Metrô, indicado para Pessoas com Deficiência. “Um passageiro,
bêbado, se posicionou estrategicamente em frente da minha cadeira de rodas,
quando as suas partes íntimas ficavam na altura da minha boca. Ele simulava
movimentos, se esfregando na minha cadeira de rodas”, contou.
Uma
amiga, que acompanhava Ivone, tentou interceder e o homem se alterou. Uma
passageira argumentou, mas foi agredida verbalmente. Ela, então, desceu do trem
e na próxima estação cinco seguranças da companhia metroviária entraram no
vagão. O assediador percebeu e todos os demais passageiros notaram que ele
simulava a embriagues, pois na verdade estava sóbrio.
“Com
medo, eu não quis formalizar a denúncia de assédio sexual, pois viajava todos
os dias, naquele mesmo horário, naquele percurso”, justificou Ivone. Garantiu,
no entanto, que se a situação se repetir ela fará questão de fazê-lo. “Naquela
época eu não tinha a informação que tenho hoje, me arrependo de ter me calado”,
justifica.
Hoje,
engajada, ela ajuda outras Pessoas com Deficiência. Por exemplo, o parente de
uma cadeirante agredida pelo marido, há três meses e que não tinha como sair do
hospital depois de receber alta. “As instituições de assistência não estão
equipadas para acolher e atender as s de uma mulher com deficiência vitimada”
pondera.
“Se
para uma mulher sair na rua sozinha ou conviver com um agressor já é difícil,
imagine para uma mulher com deficiência”, alerta Ivone. Atraente, a gata de
rodas leva uma vida normal, apesar de preferir sair acompanhada. “Somos mais
vulneráveis.”, justifica
Agressões sutis
Apesar
de ter curso superior, diplomada em Contabilidade, Ivone trabalha como
operadora de telemarketing. “É muito difícil para um profissional com
deficiência conseguir um emprego de chefia”, alega. Para ela, isso também é um
tipo de violência, como inúmeras outras vivenciadas pelas Pessoas com
Deficiência no dia a dia.
“Mesmo
no ambiente familiar muitos são deixados de lado ou obrigados a ouvir frases
desmotivadoras, quando os próprios familiares os colocam para baixo”, alerta.
Por exemplo: quem vai querer casar com uma mulher numa cadeira de rodas?
“Crianças
são educadas através da violência moral, no ambiente familiar ou escolar, ao
invés de serem tratadas com respaldo e segurança”, completa.
Ivone
explica que as agressões acontecem como rotina, das violências físicas, morais
á opressão.
No
ambiente externo, a falta de serviços públicos de qualidade e oportunidades são
agressões diárias. Ivone relata a dificuldade de andar de cadeira de rodas na
chuva ou de usar o transporte público nos horários de pico de movimento.
“Tem
gente que me pergunta o que eu estou fazendo no trem naquele horário. Ficam
perplexos ao ouvir a minha resposta, quando explico que estou voltando do
trabalho. Isso também é uma violência”, finaliza.
Serviço:
Delegacia
de Polícia da Pessoa com Deficiência
Atende
de segunda a sexta-feira, das 9 às 18hs
Endereço:
Rua Brigadeiro Tobias, 527 (Linhas Amarela e Azul, próxima estação Luz do
Metrô)
Telefone:
11 33113380 / 3381 / 3383
Mais detalhes em:
Texto:
Adriana do Amaral
Fonte: Câmara Inclusão
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