Brasil gigante Paraolímpico
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O
segredo do primeiro lugar no Parapan 2015 e de bons desempenhos em sequência é
o de sempre: investimento
Jane
Gögel ganhoJane Gögel ganhou medalha de ouro no tiro com arco
Foto: Daniel Zappe
/ MPIX/CPB
O
Brasil pode não viver um grande momento, mas o Parabrasil está com tudo. É
superpotência. Voltou do Parapan de Toronto, encerrado há uma semana, não só na
condição de campeão no quadro geral de medalhas, mas com mais ouros do que o
segundo e o terceiro colocados juntos – no caso, os poderosos Canadá e Estados
Unidos. Na bagagem, os brasileiros trouxeram 90 quilos em medalhas, 257 no
total, quase uma para cada integrante da delegação de 272 atletas. Não houve
uma mísera modalidade em que o Parabrasil não tenha subido ao pódio.
A
razão para o sucesso do paradesporto nacional é simples: dinheiro. Toda vez que
um brasileiro deposita na Mega Sena, na Quina ou em qualquer outra loteria
federal as suas esperanças de levar uma vida de marajá, os cofres do Comitê
Paralímpico Brasileiro (CPB) incham um pouquinho. Desde 2001, com a aprovação
da Lei Agnelo/Piva, 2% da arrecadação das loterias são direcionados ao esporte.
Do montante, 85% seguem para o Comitê Olímpico Brasileiro. Os demais 15% ficam
com o CPB. Até 2014, já haviam sido repassados ao paradesporto mais de R$ 250
milhões. Antes da lei, o Brasil arrematava uma média de 2,75 ouros a cada
paralimpíada. Depois, passou para 17.
– O
esporte paralímpico era completamente amador. A partir da lei, se organizou e
consolidou. Os resultados começaram a aparecer. Não é qualquer país que tem,
hoje, uma estrutura como a nossa, com recursos garantidos. É até um paradoxo.
No Brasil, onde falta investimento para tudo, o paralímpico vai bem – comenta
o advogado Luiz Cláudio Portinho Dias, presidente da ONG RS Paradesporto.
A Lei
Agnelo/Piva representa a principal fonte de recursos do CPB, mas não a única.
Rendeu no ano passado R$ 39 milhões, de um orçamento total de R$ 82 milhões. O
excedente vem principalmente de um patrocínio da Caixa (média de R$ 30 milhões
ao ano), mas também graças a repasses do Ministério do Esporte e de convênios
com o governo de São Paulo e a prefeitura do Rio. Segundo o presidente do
comitê, Andrew Parsons, isso coloca o Brasil em um patamar de investimento
próximo ao das principais potência paralímpicas – China, Grã-Bretanha, Rússia,
Austrália, Ucrânia e EUA.
Obviamente,
o vil metal só se transformou em ouro, prata e bronze porque foi bem aplicado.
Hoje, o país mantém um alentado calendário de campeonatos regionais e nacionais
em todas as 22 modalidades paralímpicas. A bonança também serviu para financiar
os Jogos Paralímpicos Escolares, que na última edição reuniram 1,2 mil crianças
e adolescentes que haviam se destacado nas seletivas estaduais. Maior do mundo,
essa estrutura permite garimpar talentos precoces, caso do paraense Alan
Fonteles, descoberto aos 14 anos, trabalhado pelo CPB e hoje colecionador de
ouros e recordes mundiais em provas de 100m e 200m. Em 2012, virou notícia ao
vencer o então badalado paratleta – hoje homicida condenado – Oscar Pistorius
nos Jogos de Pequim.
Dinheiro
direto para os atletas também faz parte da equação. Quem conquista as primeiras
posições em competições nacionais ou internacionais ganha direito a uma bolsa,
concedida pelo governo. No Parapan, 96,8% das medalhas foram obtidas por
bolsistas. Em muitos casos, os valores são modestos, mas a bolsa-pódio,
direcionada a quem tem maior potencial, pode chegar a R$ 15 mil por mês.
Essa
receita permite a muitos paratletas dedicar-se ao esporte em tempo integral. A
halterofilista Marcia Menezes, por exemplo, dividia-se entre a modalidade e
dois empregos. Obteve uma bolsa e passou a dedicar-se exclusivamente ao
levantamento de pesos. No ano passado, conquistou o bronze no campeonato
mundial.
Segundo
Felipe Jacovazzo, diretor-técnico da Associação Nacional de Desporto para
Deficientes, um dos efeitos das bolsas é estimular o alto rendimento:
– As
bolsas são a grande fonte de renda de boa parte dos atletas. Como a renovação é
anual, o atleta tem de estar sempre na melhor performance, porque é o resultado
que vai manter a bolsa dele.
É
claro que há algumas questões complicadas. Para Portinho Dias, a dificuldade
que a pessoa com deficiência encontra para ingressar no mercado transformou o
paradesporto em opção de segurança financeira – o que não ocorreria em outros
países, onde há mais oportunidades profissionais e acadêmicas. Ele diz que, no
Brasil, virar paratleta é quase como ser funcionário público.
Há
ainda a grande quantidade de deficientes no Brasil, população estimada em 30
milhões. Andrew Parsons, presidente do CPB, afirma que não há correlação entre
esse aspecto demográfico e o sucesso do paradesporto de um determinado país.
Mas o perfil do paratleta brasileiro apresenta particularidades tipicamente
verde-amarelas. Dos 272 integrantes da delegação enviada a Toronto, 43 eram vítimas
da carnificina no trânsito. Outros 34 adquiriram a deficiência como decorrência
de problemas na gestação ou no parto, outra fragilidade nacional. Há ainda as
vítimas da criminalidade e da violência que grassam no país.
– O
Brasil é um dos países com mais pessoas com deficiência. Há muito jovens
acidentados de trânsito ou vítimas de armas de fogo. São paradoxos que o
esporte paralímpico acaba suscitando. No fundo da questão, se for analisar, vai
ver que o sucesso do esporte paralímpico é proporcional a várias mazelas do
país – acredita Portinho Dias.
Tiago
Paulino na prova de arremesso de disco
Mais
dinheiro à vista
Se
financiamento se traduz em medalhas, o Brasil pode esperar resultados ainda
melhores no paradesporto. A legislação que prevê repasse de valores das loterias
foi alterada para beneficiar o setor. Em lugar de 2%, 2,7% da arrecadação será
destinada ao esporte. O acréscimo será destinado integralmente ao Comitê
Paralímpico Brasileiro (CPB). A previsão é que o repasse pule de R$ 39 milhões
ao ano para R$ 130 milhões.
Fonte:
Zero Hora
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