Em novo experimento, células-tronco ajudam na recuperação de lesões medulares
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Por Flávia
Franco
Estudos com
células-tronco aparecem como um campo promissor na busca pela cura de diversas
enfermidades. Uma das linhas mais proeminentes de pesquisa com essas
estruturas, contudo, não tem o objetivo de controlar propriamente uma doença,
mas sim recuperar tecidos destruídos após acidentes, como os casos de lesões na
medula espinhal, que deixam pessoas paraplégicas ou tetraplégicas. Em busca de
restaurar a comunicação e as conexões interrompidas nesse tipo de situação,
pesquisadores americanos realizaram experimentos envolvendo células-tronco e
camundongos com resultados muito positivos, aumentando a esperança de que,
futuramente, humanos possam ser beneficiados com esse tipo de tratamento.
Publicado na
revista especializada Neuron, o estudo coordenado por Mark Tuszynski, da
Universidade da Califórnia San Diego, foi capaz de criar neurônios a partir de
células-tronco pluripotentes induzidas (IPSCs, na sigla em inglês), que, uma
vez transplantados para roedores, mostraram-se capazes de recuperar lesões na
região cervical. As IPSCs são estruturas muito similares às células-tronco
embrionárias, apresentando as mesmas características de autorrenovação e sendo
capazes de se transformar em qualquer tecido do organismo. Contudo, em vez de
serem retiradas de um embrião, são fabricadas em laboratório a partir de
células adultas.
De acordo com
Jaderson Costa da Costa, neurologista do Instituto do Cérebro do Hospital São Lucas,
da PUC-RS, as iPSCs podem ser obtidas a partir do cultivo de qualquer célula do
corpo, sendo as mais utilizadas para essa técnica os fibroblastos da pele.
“Para que se tornem células pluripotentes, devem ser expostas a vetores que
contenham genes que conferem um estado de indiferenciação celular”, explica.
O especialista
afirma que as iPSCs são muito utilizadas em terapias celulares, nas quais são
retiradas células do próprio paciente para serem reprogramas e, depois,
reinseridas na pessoa para tratar determinada doença. Foi um processo
semelhante a esse que os pesquisadores americanos utilizaram para tratar as
lesões na medula espinhal dos camundongos. Mas, no lugar das células retiradas
dos próprios animais, eles partiram de amostras de pele de um homem de 86 anos
(veja infografia). Para Costa, que não participou do estudo, a idade do
paciente doador das células usadas para gerar as IPSCs é um dado interessante.
Segundo ele, o novo estudo corrobora a ideia de que as pluripotentes são
geradas com sucesso mesmo a partir de tecidos de indivíduos com idade mais
avançada.
Depois de
transformadas em neurônios, as células foram aplicadas em camundongos que
tinham sofrido lesão medular havia duas semanas. Os cientistas notaram, então,
um crescimento notável ao longo do comprimento do sistema nervoso central dos
camundongos. Para Tuszynski, a pesquisa abre novas possibilidades de estímulo
do crescimento de neurônios em humanos com lesões medulares. “Esses resultados
indicam que os mecanismos neuronais estão aptos a superar as barreiras criadas
por algum tipo de lesão na medula espinhal e estendem axônios por toda a coluna
vertebral”, afirma o autor do estudo.
O fato de a
contusão tratada ser recente é um dado importante, de acordo com o
neurocirurgião Roberto S. Martins, do Hospital Israelita Albert Einstein. “De
uma forma geral, quanto mais precoce o tratamento é instituído, maior é a
chance de não haver modificações definitivas no sistema nervoso, o que
influencia os resultados”, aponta.
Longo caminho
Dando sequência
ao experimento, os pesquisadores observaram as mudanças nos animais por três
meses. Os exames mostraram a formação de neurônios maduros e o crescimento de
fibras nervosas ao longo de toda a medula espinhal. Porém, mesmo apresentando
conexões entre os neurônios dos camundongos e os implantados, os cientistas não
foram capazes de restaurar a funcionalidade das células danificadas. “As
conexões podem não ser adequadamente funcionantes ou insuficientes para atingir
a função. A reconstituição de toda a via nervosa é extremamente complexa, por
isso, não basta só reconstituir a via, é preciso haver uma integração efetiva
entre elas”, analisa Martins.
Para Márcio
Vinhal, neurocirurgião do Hospital Santa Luzia, os resultados obtidos pelo
estudo são inovadores, mas ainda falta um longo caminho até a recuperação
completa da medula. “Do ponto de vista laboratorial, houve um grande
crescimento dos neurônios na região da lesão, mas ainda não temos a
funcionalidade deles”, explica. O médico ressalta que o feito dos pesquisadores
americanos — o de terem sido capazes de reproduzir os neurônios — é inédito,
mas apenas o primeiro passo.
Jaderson Costa
concorda: “O estudo é preliminar e, embora os resultados sejam promissores,
várias barreiras devem ser vencidas para que se obtenha melhora significativa
na função motora e sensitiva”. Vinhal complementa lembrando que, só com a
restauração da funcionalidade dos neurônios, será possível recuperar o
movimento dos membros. “É como o monstro de Frankenstein, que precisava de um
choque elétrico para viver. Precisamos encontrar uma forma de criar a corrente
necessária para que os neurônios voltem a funcionar”, compara.
Martins destaca,
ainda, o fato de que não basta as células se desenvolverem, serem incorporadas
e estabelecer conexões. “A função final obtida, como caminhar, é uma atividade
complexa e depende da integração de várias vias em diversos níveis do sistema
nervoso, que devem ser reconstituídas desde a medula até o órgão enervado.”
Enquanto essa
etapa não é resolvida, os especialistas apostam em experimentos realizados com
células-tronco dos próprios pacientes, e não de terceiros. A expectativa é de
que, dessa forma, talvez se consiga um resultado ainda mais positivo. Para
Costa, as vantagens de se utilizar tratamentos com células iPSCs são inúmeras.
“Essa alternativa elimina o conflito ético do uso de células-tronco
embrionárias e facilita a obtenção de grande quantidade para os transplantes”,
afirma.
Fonte: Correio
Braziliense E Blog Deficiente Ciente
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