Rogério Junqueira fala sobre a formação e a presença de professores com deficiência nas escolas brasileiras
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Uma
escola que acolhe e valoriza a diversidade não é melhor apenas para aqueles
considerados diferentes”. Muitas barreiras arquitetônicas, culturais e
atitudinais ainda impedem a inclusão de professores com deficiência.
Rogério
Diniz Junqueira é doutor
em
Sociologia e pesquisador do
Instituto
Nacional de Estudos e
Pesquisas
Educacionais
Anísio
Teixeira (Inep)
|
Por
que é importante incluir profissionais com deficiência nas escolas brasileiras?
ROGÉRIO
DINIZ JUNQUEIRA -Um professor é um adulto de referência e suas atitudes produzem
efeitos significativos nos alunos. Além de romper com a invisibilidade a que
essas pessoas costumam ser submetidas, a presença de um docente com deficiência
projeta para os estudantes a figura de um cidadão que luta para ter seus
direitos respeitados e tem deveres a cumprir. Esse educador é, ainda, a
demonstração de algo que deveria ser óbvio: a deficiência não representa um
impedimento à aquisição e à transmissão de saber. Além disso, essa é uma
oportunidade valiosa, para todos, de convívio com a diversidade.
Em
que medida esse contato com a diversidade colabora com a formação dos alunos?
JUNQUEIRA
- A diversidade instiga e inquieta. Uma vez percebida em um processo dialógico,
pode ser extremamente pedagógica. Ela ensina ao oferecer às pessoas a oportunidade
de desmistificar o que imaginam acerca de si mesmas, do outro e do mundo. Nesse
cenário, o estudante aprende a notar diferenças no que antes parecia homogêneo
e a encontrar semelhanças no que era estranho. Uma escola que acolhe e valoriza
a diversidade não é melhor apenas para aqueles considerados diferentes, é um
ambiente melhor para todos.
Segundo
o Censo Escolar de 2012, há pouco mais de 6 mil professores com deficiência nas
escolas públicas brasileiras. Desses, 136 são cegos, 208 surdos, 48 possuem
deficiência intelectual e mais de 2,5 mil têm alguma deficiência física. O que
explica a presença de pessoas com deficiência física ser muito maior que a de
surdos, cegos e com deficiência intelectual?
JUNQUEIRA
A falta de acessibilidade ainda é um entrave para a presença maior de
professores com deficiência física na Educação Básica. No entanto, o estudo do
cotidiano escolar nos mostra uma riqueza de estratégias adotadas para contornar
barreiras físicas. Muitas soluções são improvisadas e algumas com relativo
êxito: uma rampa precária é arrumada, uma porta é alargada, dinheiro é coletado
para uma pequena reforma do banheiro e uma sala de aula é criada no térreo.
Tende a ser relativamente mais fácil improvisar uma rampa de madeira do que
conseguir produzir materiais bem adaptados para professores ou estudantes cegos
e surdos.
O
que tem impedido a inclusão de pessoas com deficiência na Educação?
JUNQUEIRA
Historicamente, as pessoas com deficiência, transtornos do desenvolvimento e
outras necessidades educacionais especiais (NEE) enfrentam um cenário marcado
por barreiras e altos índices de preconceito e discriminação em praticamente
todos os espaços sociais. Nas escolas, vários fatores agravam o quadro de
vulnerabilidade educacional dessa população. Entre eles estão as desigualdades
socioeconômicas, a carência de políticas mais efetivas de acesso e de
permanência, a adoção de modelos educacionais focados na concentração dos
alunos com deficiência em escolas exclusivas e a escassez de investimentos na
formação especializada de professores.
Mesmo
assim, a matrícula nas escolas regulares tem crescido nos últimos anos, certo?
JUNQUEIRA
Sim. Desde 1998, o país passou a registrar um gradativo aumento nas matrículas
em Educação especial. Oficialmente, elas mais do que dobraram em dez anos. Esse
aumento geral correspondeu a um aumento ainda maior da participação desses
estudantes em escolas regulares (e a um declínio nas matrículas em escolas exclusivas
ou em classes especiais). Isso implicou desafios crescentes para todos os
sistemas públicos de Educação que, com frequência, em que pesem os esforços,
admitem não se encontrar preparados.
Universidades
estão preparadas para receber esses alunos?
JUNQUEIRA
As universidades se encontram diante de um enorme desafio e muitas delas,
especialmente as privadas, parecem ainda não ter se colocado essa questão da
maneira mais adequada. No entanto, penso que o problema seja anterior: além da
importância de se preparar para receber adequadamente essa população, é preciso
discutir sobre as barreiras que impedem que a maioria delas chegue ao Ensino
Superior.
O
vestibular representa uma barreira específica às pessoas com deficiência?
JUNQUEIRA
Sim, os exames de seleção, os concursos públicos e as avaliações em larga
escala representam obstáculos para essas pessoas. A acessibilidade está
assegurada por lei, mas na prática não é respeitada. Garantir o seu cumprimento
é indispensável para o acesso aos demais direitos. Os sites das universidades,
os editais e os sistemas de inscrição dos vestibulares devem ser acessíveis. Os
exames precisam passar por adaptações e incluir provas em braile, textos com
fontes ampliadas, descrição das imagens, alteração da redação dos enunciados,
provas em libras etc. A escolha dos locais de prova deve obedecer aos
princípios de acessibilidade urbana, arquitetônica e de mobiliário. Além disso,
é fundamental assegurar a presença de profissionais de apoio devidamente
capacitados. Além disso, as bancas de correção precisam ser compostas por
especialistas capazes de considerar as particularidades da expressão escrita
das pessoas com deficiência auditiva e também nos casos mais acentuados de
dislexia.
E
quais outros empecilhos culturais e atitudinais existem?
JUNQUEIRA
Quando alguém acredita que pessoas com deficiência estejam fadadas ao fracasso
escolar estamos diante de uma barreira cultural. Agir com paternalismo ou
comiseração são exemplos de barreiras atitudinais. Sendo assim, a promoção da
acessibilidade na universidade e fora dela não deve ficar limitada à importante
eliminação dos problemas arquitetônicos. Ela requer uma compreensão sobre as
relações de interdependência voltadas a prover apoio especializado e garantir
acesso aos demais direitos, como Educação, saúde, cultura, comunicação,
trabalho, segurança, lazer, convívio social e participação política.
Fonte:
revistaescola.abril.com.br
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