Acessibilidade digital no ENEM: por que isso importa?
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Nenhuma “porta” deve permanecer “fechada” para as Pessoas com
Deficiência (PCD). Mais ainda: existem “portas” que, quando “fechadas”, torna
imensurável o prejuízo da exclusão, perde-se a visão de um novo horizonte de oportunidades.
O ENEN é uma dessas por Lucinda Leria*
A melhora de qualidade no Exame Nacional do Ensino Médio, nos últimos
anos é inegável, visto que no passado tivemos problemas de fraudes. A
acessibilidade do exame para o aluno com deficiência também teve avanços. O
Instituto Nacional de Ensino e Pesquisa (INEP) vem atuando, ao eliminar
barreiras arquitetônicas, disponibilizar rampas, salas com acesso e
individualizadas, ledores e outros recursos para provas. Contudo, no que diz
respeito à acessibilidade digital das provas, o INEP ainda tem um longo caminho
a percorrer e, enquanto isso, as PcDs - especialmente os que necessitam de
recursos digitais -, não tem igualdade de condições em relação aos demais
candidatos, convivendo com uma situação de injustiça, impotência e exclusão.
A necessidade existe?
A acessibilidade digital e o uso do computador nas provas podem
beneficiar pessoas com diversos tipos de deficiência, como por exemplo visual,
física nos membros superiores, tetraplegia, dislexia e surdocegueira.
Considerando somente a situação das pessoas com deficiência visual (58,0% das
PcD – de acordo com o Censo Demográfico/IBGE 2010), é possível dizer o
seguinte.
Em 2012, aproximadamente 7.000 PcD visuais prestaram a prova do ENEM,
sendo por volta de 1.000 PcD visual eram cegos (*). Quantidade irrelevante
perto dos 5.791.290 (**) inscritos, em outras palavras, somente um percentual
“residual” de 0,12 % dos participantes do ENEM/2012 possuíam deficiência
visual. A baixa participação evidência que muitos são excluídos antes da prova
e que é necessário um o enorme esforço, para uma PcD, conseguir concluir o
ensino médio. Os poucos que heroicamente conseguem, ainda assim, encontram
barreiras durante as provas, como as do ENEM.
Apesar da insistência do INEP em afirmar que o ENEM é acessível, no
último exame foram encontradas, nas 180 questões que compuseram as provas, por
volta de 100 eneagramas entre figuras, gráficos, desenhos etc. Alguns desses,
praticamente impossíveis de serem descritos. Isso é acessibilidade ?!?
Quais os benefícios propiciados pela Tecnologia Assistiva (TA?
Para o ENEM de 2012, o INEP disponibilizou como apoio para o aluno com
deficiência visual, provas em Braille, provas ampliadas(em tamanhos previamente
definidos pelo próprio INEP), Ledores e Transcritores, que são fiscais
treinados para auxiliar, respectivamente, na leitura da prova e na transcrição
do texto em Braille para tinta e vice-versa. Não foram disponibilizados
recursos de tecnologia assistiva associada ao computador e o mesmo acontecerá
no ENEM de 2013, segundo o site do INEP.
Resumidamente, a automatização eletrônica da prova com o uso do computador,
poderá trazer os seguintes benefícios às PcD:
1 – Autonomia: utilização dos diversos recursos de TA como ampliadores
de telas, leitores de tela, mouse virtual e mouse adaptado, permitem a
eliminação das barreiras digitas e garante a autonomia das PcD no momento da
prova. O uso da TA para computador permite ao aluno escrever a redação silenciosamente,
sem ter de ditar para uma pessoa e revisar o seu texto com autonomia, sem ter
que enfrentar situação, que muitos consideram constrangedora, de solicitar e
depender da ajuda de outra pessoa em momento de prova.
2 - Não depender do “preparo” do Ledor/Transcritor: o aluno depende das
habilidades de outra pessoa para execução da prova, e essas, muitas vezes,
podem não estar preparadas. A TA permite uma situação de maior igualdade frente
aos candidatos sem deficiência.
3 - Processo automatizado: o ENEM possui diversos tipos de provas, sendo
que para cada tipo, existe uma “Prova do Ledor” relacionada, com descrição de
gráficos, figuras etc.. A prova do Ledor tem que ser do mesmo tipo da prova e
do gabarito do aluno. O processo de distribuição e separação das provas é
manual e está sujeito a falhas, pois depende de pessoas. Um jovem com
deficiência, no último ENEM, descobriu, apenas quando estava na questão número
60, que a sua prova não correspondia à do ledor.
Vale destacar que automatizar a prova do ENEM, não significa eliminar o Ledor,
Braille e/ou os demais tipos de apoio atualmente existentes. A escolha deve ser
sempre do vestibulando com deficiência. É importante lembrar que com a expansão
do uso do computador e a evolução da TA, surge uma nova geração que não lê
Braille. Logo, o uso do computador e a acessibilidade digital é uma forma de
acesso à informação para as PcD que utilizam desses recursos. Por que não podem
utiliza-las em um momento de prova?
Existem motivos para não resolver tal situação de forma efetiva?
Recursos materiais e/ou financeiros? A quantidade de PcD no ENEM
infelizmente é ainda irrelevante.
Segurança? Existem formas de garantir a segurança. Votamos de forma
eletrônica. Votar assim não é seguro?
Desconhecimento sobre o tema? O exame segundo o INEP é acessível.
Não envolvimento de PcD no processo de acessibilização das provas ? Uma PcD
visual provavelmente questionaria a grande quantidade de perguntas com apelo
visual (100 na prova de 2012?!). Existem outras formas de testar conhecimentos
específicos além de gráficos.
Por que isso é muito importante?
Um aplicativo elaborado com qualidade para automatizar e acessibilizar a
prova do ENEM, pode estabelecer um padrão nacional de provas acessíveis. Essa
ferramenta pode ser reutilizada em outros anos e replicada para ser usada em
outras provas ou concurso públicos. Pode inclusive, e porque não, ser utilizado
pelas pessoas sem deficiência.
Criar provas e concursos acessíveis é o caminho para transformar uma
situação de dependência e paternalismo em usufruto da cidadania e de autonomia,
de pobreza em riqueza, de ignorância em cultura e, finalmente, de exclusão em
inclusão. Por isso INEP, quando teremos a resposta para estas questões ???
A Deputada Federal Mara Gabrilli ingressou com o um requerimento, em
maio de 2013, solicitando formalmente ao Ministério da Educação e Cultura, a
acessibilidade digital no ENEM e demais provas sob a supervisão do MEC.
Todos podemos colaborar nessa importante iniciativa, especialmente, as PcD.
Estudantes com deficiência, que passaram por problemas durante a realização dos
últimos exames, contem suas experiências e colaborem para a melhoria do
sistema. O e-mail para envio de sugestões é: maragabrilli@maragabrilli.com.br
Requerimento da deputada federal Mara Gabrilli: http://www.camara.gov.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=572912
Recomendação de TA com o uso do computador do MPF (Nov/2012)http://www.prpe.mpf.gov.br/internet/Caruaru/Noticias/Acessibilidade-em-processo-seletivo-do-Inep-e-alvo-de-recomendacao-do-MPF
Pessoas com deficiência reivindicam acessibilidade nas provas do ENEM e
do ENADE (Dez/2012)http://www.ibdd.org.br/noticias/noticias-noti-169-enem-enade.asp
*Lucinda Leria é profissional de Tecnologia da Informação, formada pela
Faculdade de Tecnologia de São Paulo e pós-graduada pela Faculdade de Engenharia
de Produção da Escola Politécnica da USP. Trabalha com Tecnologia de Informação
há 26 anos, sendo que nos últimos 10 anos, tem atuado como Líder de Projetos em
instituições financeiras e com projetos do Serviço de Apoio ao Cliente (SAC).
Desde 2011, trabalha como Consultora em Acessibilidade Digital. Atua também
como Pesquisadora do CNPq, em pesquisa de Tecnologia Assistiva, para o
Ministério da Ciência e Tecnologia e Inovação.
Fonte: Rede Saci
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