26 de Julho, dia do Intérprete de Libras: o que comemorar?

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O dia 26 de julho é denominado o dia Nacional do profissional Intérprete de Libras (ILS). A data foi acordada e promovida pela comunidade surda para valorizar os profissionais que propiciam a eles acessibilidade comunicacional. No entanto, precisamos, antes de festejar e celebrar essa data comemorativa, questionarmos se há algo para ser comemorado.

Observando rapidamente os últimos onze anos, podemos constatar que alguns avanços aconteceram em relação à profissionalização do ILS. A Lei de Libras 10.436/02, exaustivamente citada em todas as retrospectivas sobre os ganhos da comunidade surda, foi realmente um divisor de águas em relação à inclusão social dessa comunidade propiciando, dentre outros aspectos, um olhar mais valioso para a Libras e para os seus usuários: os surdos.

No entanto, foi o Decreto 5.626, em 2005, regulamentador da Lei de Libras, que apontou caminhos para a inclusão dos surdos nas diversas esferas sociais. Dentro os caminhos apontados está a formação de profissionais Tradutores Intérpretes de Libras e Língua Portuguesa em nível superior.

Com a determinação legal de formação inicia-se uma corrida para que os profissionais atuantes, já há alguns anos, continuem seu trabalho sem que sejam cerceados devido a ausência de formação, bem como a promoção de espaços formativos para aqueles que desejam enveredar por esse caminho.

Nesse prisma, são criados os cursos de Bacharelado em Letras/Libras pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) em parceria com o Ministério de Educação e o Exame Prolibras, que possui o papel de certificar profissionais que já possuem atuação reconhecida pela comunidade surda. Porém, essa certificação possui prazo para finalização. Segundo o Decreto, ela acontecerá pelo período de dez anos, enquanto as instituições superiores organizam cursos de formação em nível superior na área de Tradução e Interpretação de Libras/Português.

Em 2010 a profissão é regulamentada com a Lei 12.319 com vetos nos itens que exigem formação em nível superior na área de Tradução e Interpretação de Libras/Português. As razões dos vetos são coerentes, uma vez que o próprio Decreto 5.626/05 autoriza a atuação de profissionais que possuem graduação em áreas afins, mas que sejam devidamente certificados pelo Prolibras ou que tenham concluídos cursos de especialização voltados à prática da interpretação.

Percebemos, então, uma resolução da díade demanda e controle. Caso a Lei de regulamentação da profissão fosse sancionada com seu texto original, somente os profissionais com a graduação em Letras/Libras poderiam atuar a partir de sua publicação. Esses profissionais, formados no fim de 2012 pela UFSC, única universidade pública a promover o curso em sistema EaD alcançando boa parte do território nacional, não totalizam quinhentos ao todo para atender a demanda de mais de nove milhões de surdos e pessoas com deficiência auditiva. 

Algumas instituições de ensino superior vêm promovendo cursos de especialização na área da Tradução e Interpretação da Libras/Português buscando, também, atender às exigências do Decreto que determina a formação em nível de extensão, graduação e pós-graduação.

Somado a isso, as pesquisas sobre a prática de interpretação da Libras filiadas a alguns programas de pós-graduação stricto sensu nas Ciências Humanas como Linguística, Linguística Aplicada, Educação, Semiótica, Estudos da Tradução e Interpretação em universidades públicas e privadas em todo o Brasil fortalecem e legitimam a necessidade desses profissionais para a promoção da inclusão social das pessoas surdas.

A partir desse panorama, notamos que avanços significativos da profissionalização foram sim alçados nos últimos anos. No entanto, algo deve ser considerado em todo esse processo: o distanciamento do profissional ILS da comunidade à qual ele presta serviços.

Essas considerações foram enfatizadas de maneira contundente no II ELATILS (Encontro Latino Americano de Tradutores Intérpretes e Guias-Intérpretes de Língua de Sinais) realizado no Rio de Janeiro entre os dias 17 e 21 de Julho desse ano. Os pesquisadores e presidentes das associações de intérpretes da América Latina e Caribe e de alguns países da Europa sinalizaram a necessidade de retorno à motivação primeira da existência desses profissionais: os surdos.

Historicamente, os ILS possuem grande atuação na chamada interpretação comunitária, isto é, a partir da relação estreita com a comunidade surda e isso, com a formação em nível superior e a grande inserção desses profissionais na esfera acadêmica, tem se diluído e os surdos tem deixado de confiar naqueles que são fundamentais para a mediação das interações entre eles e os não falantes da língua de sinais.

Além dessas questões, a crescente demanda de contratação dos ILS nas instituições educacionais, nas conferências de interesse público e em diversos espaços que demandam sua presença, principalmente nas grandes metrópoles, vem promovendo um sucateamento dos serviços de interpretação. As empresas que estão sendo abertas com o objetivo de prestar esses serviços não contratam profissionais com formação ou com qualquer habilidade linguística e/ou tradutória. Algumas delas escolhem pessoas que ainda estão em processo de aprendizagem da língua para ocuparem esses lugares impedindo, portanto, que os surdos possuam, efetivamente, acessibilidade de comunicação. 

A comunidade surda deve se posicionar contra essas práticas e exigir dos contratantes profissionais habilitados para atuarem como ILS, não aprendizes da língua que não possuem qualquer condição de realizar uma interpretação.

O Dia 26 de Julho foi criado justamente pela comunidade surda para valorizar esse profissional. No entanto, só podemos comemorar o dia do ILS se estiver presente em nossas mentes e objetivos profissionais o que o serviço que prestamos e toda a nossa formação profissional possui um público específico: a comunidade que é usuária da língua que é nosso objeto de trabalho. 

No mais, para os que realmente possuem um compromisso com a comunidade surda, para os que se preocupam com a valorização da profissão, para os que promovem eticamente a profissionalização dos ILS, desejo um Feliz Dia do Intérprete de Libras.

Fonte: Blog Em pauta surdez e diferença 

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