A sexualidade e a Lesão Medular: o que queremos saber e temos receio de perguntar!
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Entrevista
com:
Dra. Maria Ribeiro da Cunha
Dra. Maria Ribeiro da Cunha
P.:
Existem vários tipos de sexualidade, e a de um lesionado medular será
necessariamente diferente. Isto é muitas vezes um factor de insegurança, tanto
para o lesionado, como para a(o) sua(seu) companheira(o). Qual entende que seja
a melhor abordagem à questão? Para a Dra. que realiza trabalho nesta área,
existe algum profissional de saúde mais vocacionado para este tipo de questões?
Em 2002 a
OMS definiu a sexualidade como sendo: “um aspecto central do ser humano ao
longo da vida, englobando o sexo, identificação do gênero e seu papel,
orientação sexual, erotismo, prazer, intimidade e reprodução”.
A lesão
medular tem um impacto muito significativo na diminuição do desejo sexual por
algumas das suas consequências físicas e psicológicas, como sendo: a
dependência de 3ª pessoa, a inversão dos papéis nas relações pessoais, a dor, a
espasticidade, a limitação da mobilidade, as deformidades físicas, o medo de
descontrolo esfincteriano, a depressão, entre outras.
Assim, a
questão da função sexual, entendida pelos lesionados medulares como uma das
suas principais preocupações na fase subaguda e crónica da lesão, deverá ser
abordada no contexto da sua reabilitação integral e abrangente, de uma forma
natural e, como em todas as outras vertentes, recorrendo a uma equipa
pluriprofissional.
Além da
explicação daquilo que acontece em termos fisiopatológicos na lesão medular,
com repercussão na função sexual, deverá ainda ser aconselhado tentar uma
mudança na conceptualização da sexualidade, no sentido de uma menor
“genitalização” do ato sexual, procurando outras formas e manifestações de
relação com a(o) parceira(o), de prazer e de satisfação.
Existem
ainda programas de reabilitação psicossexual muito válidos. Têm geralmente a
duração de seis-oito semanas, com sessões de grupo (misto) semanais, com
duração de uma hora, sendo encorajada a participação dos doentes e
respectivo(a)s companheiro(a)s.
Nestas
sessões, são geralmente abordados diferentes temas como por exemplo: a resposta
sexual humana e factores que podem afectar essa resposta, efeitos da lesão
medular sobre a sexualidade, sexualidade e incontinência, e sexualidade,
casamento e divórcio, procurando-se aqui incentivar a partilha de experiências
e a interacção dos doentes.
P.: A
lesão medular implica limitações físicas, em que se incluem a função sexual.
Obviamente, a gravidade desta disfunção irá variar com o tipo de lesão. Pode
traçar-nos um esquema das principais repercussões nesta vertente, distinguindo
o que pode acontecer no caso do homem e no caso da mulher?
De uma
forma genérica, e para lesões completas, podemos resumir as alterações mais
frequentes segundo o quadro seguinte:
Nas lesões
incompletas, os achados são variáveis, dependendo do grau de preservação
medular.
P.: Para
as pessoas nesta condição que pensam em ter filhos, as dúvidas são muitas e
frequentemente pouco esclarecidas. A nível físico, quais os condicionamentos de
um lesionado medular para a maternidade ou paternidade?
Geralmente,
lesionados medulares do género masculino apresentam subfertilidade devido a
alterações ejaculatórias e patologia seminal. Muitos doentes são jovens e
desejam a paternidade biológica. Nestes casos, deve ser avaliada a
possibilidade de ejaculação por métodos naturais (possível em poucos casos), ou
utilizando diferentes métodos de obtenção seminal (vibroestimulador,
electroestimulador anal). Quando é necessário melhorar qualidade do sémen, pode
ser implementado um protocolo para diminuir a estase do fluído prostático,
através de ejaculações regulares (aproximadamente uma extracção por semana) com
o auxílio de electroejaculadores ou vibradores penianos.
Realiza-se também o seminograma com avaliação do volume seminal, pH, cor e
viscosidade, vitalidade e concentração dos espermatozóides. Dependendo dos
resultados, os doentes podem ser ensinados a realizar auto-inseminação em casa
(com colheita de sémen por métodos naturais ou com um vibroestimulador pessoal
e posterior introdução intra-uterina com seringa). Caso não se obtenha um
resultado positivo, é tentada uma inseminação, utilizando técnicas de selecção
espermática.
Nas
situações em que nenhum dos métodos atrás referidos é eficaz, os doentes são
encaminhados para uma instituição especializada para realização de
punção-aspiração testicular com agulha fina e técnicas de fertilização por
microinjeção espermática.
No caso das
mulheres, há que esclarecer que a fertilidade, após um período de amenorreia
inicial pós-lesão (4, 6 ou 8 meses), não será geralmente afectada, pelo que
precisam de usar um método contraceptivo (de preferência preservativo
lubrificado) se não quiserem engravidar. Os anticoncepcionais orais estão
desaconselhados pelo risco aumentado de trombose venosa profunda ou
tromboembolismo pulmonar. Além disso, apesar de não ser obviamente
desencorajado, devem referir-se os riscos em que as lesionadas medulares podem
incorrer com uma gravidez, como por exemplo: maior probabilidade de úlceras de
pressão, insuficiência venosa, tromboembolismo, infecções urinárias, aumento da
espasticidade ou diminuição da função pulmonar.
P.: Para
terminar, tem conhecimento de algum tipo de produto de apoio nesta área que
possa ser útil? Existe algum grupo de apoio que se debruce sobre este tema?
A
medicação oral é a primeira linha no tratamento da disfunção sexual masculina
pós-lesão medular, seguida da medicação intracavernosa.
Muito raramente (em casos refractários à medicação ou se esta está contra-indicada), podem ser utilizados anéis constritores ou sistema de vácuo para obter uma erecção suficiente para a penetração. O último recurso será o tratamento cirúrgico, com colocação de prótese peniana ou de estimulador de raízes sagradas.
Muito raramente (em casos refractários à medicação ou se esta está contra-indicada), podem ser utilizados anéis constritores ou sistema de vácuo para obter uma erecção suficiente para a penetração. O último recurso será o tratamento cirúrgico, com colocação de prótese peniana ou de estimulador de raízes sagradas.
Não tenho
conhecimento que haja atualmente algum grupo de apoio especificamente neste
área em Portugal, além das existentes consultas de Reabilitação Sexual em
Serviços de Medicina Física e de Reabilitação (infelizmente ainda escassas) e
algumas associações/grupos de lesionados medulares que divulgam informação de
diversos temas. Poderá ser uma boa ideia para um projecto futuro!
Fonte: Fisio in Forma
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